Morro de medo de quem puxa papo no supermercado

Eu reconheço esse tipo de longe. Ele não tem o olhar direcionado para as gôndolas. Ele não está verificando a lista de compras que carrega nas mãos. Ele não tem a tristeza estampada na face que todo brasileiro carrega consigo quando tem que fazer as compras no supermercado e sabe que deixará no caixa o dobro do que pagava há alguns meses.

Não.

Essa pessoa olha para os lados. Tal qual um cabeça de área habilidoso que dá o bote na hora certa sem fazer falta no meia e lhe rouba a bola, esse cara vai no seu olhar e lhe rouba a atenção quando você menos espera. Ele parece um psicopata.

Sorrateiro, lhe interrompe para fazer aquilo que nunca ninguém deveria fazer em um supermercado: puxar papo.

“Você vai levar essa marca mesmo? Aquela ali está em promoção.”

“Nunca mais eu compro isso aí. Da última vez que levei estava tudo estragado.”

“Minha esposa adora essa marca. Pode levar.”

Pronto. A caixa de Pandora foi aberta e todos os demônios libertos jamais retornarão ao seu cubículo.

Já é tarde para fugir. O chato do supermercado roubou seu olhar e mandou a frase introdutória de um longo e sacal diálogo.

Não tenho a menor dúvida que ter arame farpado cruzando os tímpanos é mais prazeroso que ouvir o papo furado de quem se dispõe a sair de casa para estabelecer contato social enquanto empurra um carrinho com uma roda travada – todo e qualquer carrinho de supermercado sempre tem uma roda travada, pode acreditar.

Do estratosférico preço do óleo de soja, o infeliz estabelece conexão com o vergonhoso VAR do Brasileirão. Dali, pula para delírios conspiracionistas do comunismo chinês e volta para a promoção de bolacha recheada perto do vencimento.

Um prodígio da inconveniência.

Mas eu tenho uma dica para você escapar dessa emboscada de morte. Coloque um produto qualquer debaixo da camiseta. Enfie uns frascos no bolso. Abra um pacote e comece a comer no corredor do supermercado. E torça para que a segurança chegue rápido. É melhor ter que responder por furto do que aguentar a lenga-lenga do chato do supermercado. O sofrimento será menor.

@pablokossa/Mais Goiás | Foto: Reprodução / Irish Examiner