ENTREVISTA

Economista diz que previsão do FMI sobre encolhimento do PIB foi otimista

O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que a economia brasileira encolherá 5,3% em 2020. O…

O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que a economia brasileira encolherá 5,3% em 2020. O panorama, que já parece trágico, pode ser ainda pior. Mestre e doutor em economia pela Unicamp, o professor da UFG Everton S. T. Rosa considera essa previsão conservadora, para não dizer otimista. “Pode chegar a -15%”, relata o docente sobre os piores cenários.

Em janeiro, a previsão era de crescimento de 2,2%. Em março, como lembra o professor, a FGV chegou a prever encolhimento de 4,4% no PIB, em decorrência da crise do novo coronavírus. Desta forma, ele aponta que a visão do FMI de queda de 5,3% em 2020 e aumento de 2,9% como totalmente irreal.

“O País não se recuperou totalmente da crise política de 2015 e 2016. Vem fazendo 1% no PIB”, declara o economista, que vê esta crise com potencial para ser pior que a grande depressão, no começo do século passado. “Lá, era colocar homens e máquinas para trabalhar. Agora não é possível fazer isso.”

Agravante

Everton vê como agravante o atual governo federal. “Quando o Estado toma uma decisão, ele dá previsibilidade. Ele é uma âncora de expectativa. O Ministério de Economia e o Banco Central. Mas nós estamos com um ministério completamente despreparado. Na verdade, já seria despreparado sem o problema que vivemos.”

O doutor em economia pela Unicamp afirma que a equipe econômica atual já era inadequada para fazer o crescimento, visto que registrou 1,1% no último ano. De acordo com ele, não possui nenhum nenhuma real medida econômica, apenas uma pauta de cortes para o empresariado. “Nada para fazer a economia avançar e subir o patamar de investimentos. Só pensa em fazer corte. Coisa que não deveria ter sido feita no pós crise de 2015/16 e muito menos neste momento”, elabora.

“A crise no mundo vai ser muito ruim, com que de investimentos e fuga de capitais, mas aqui será pior.” Conforme relatado por Everton, o governo não orienta e nem põe a mão na massa, o que faz o Congresso assumir certo protagonismo. “O orçamento de guerra, por exemplo, já deveria ter sido aprovado em março”, aponta.

Orçamento de guerra

Aprovado em primeira votação no Senado na quarta-feira (15), o “orçamento de guerra” permite a ampliação das despesas públicas para conter o coronavírus, sem as amarras que hoje restringem os gastos federais. O texto teve uma série de modificações em relação a versão aprovada na Câmara Federal.

Entre elas, a autorização que o BC compre títulos públicos e de crédito diretamente no mercado secundário, que recebeu algumas amarras do relator, senador Antonio Anastasia (PSD-MG). Para que estas operações sejam feitas, por exemplo, os títulos comprados pelo BC precisarão ter uma qualidade mínima aferida por agências de classificação de risco.

Também será necessário que o BC publique diariamente as operações que fizer e preste contas delas ao Congresso Nacional a cada 30 dias. “Em caso de irregularidade ou extrapolação dos limites desta Emenda Constitucional”, o Congresso pode sustar as decisões, informou o relator.

Sem lucro

Neste momento, o economista Everton Rosa observa que não é possível ao Estado operar de forma capitalista, motivado por lucros. Os caminhos, ele ressalta, são garantir renda de um lado e organizar e planejar uma economia de emergência de outro. “Produtos e serviços terão que ser gerados, com ou sem lucro. O privado pode ajudar, mas não tem como fazer.”

Para ele, a renda emergencial de R$ 600 é aquém do necessário e não atende a todos. “As famílias estão com dificuldades de acessar essa quantia, porque o Ministério da Cidadania, que deveria ter uma universalização de cadastros não tem; e os empresários não conseguem os créditos por conta de burocracia”, pontua.

Por outro lado, ele destaca, ainda, que é necessária uma organização de guerra, como o próprio presidente Donald Trump fez nos Estados Unidos, ao readequar a produção das empresas do setor privado. “Não para equipamento de guerra, claro, mas hospitalares. Já tinha que ter feito”, destaca, mais uma vez, a letargia do governo. “Estamos caminhando para o pior da tempestade sem estarmos prontos.”

Receio

Questionado sobre os receios em relação a esta crise, ele diz que a pandemia pode em si pode facilitar a aprovação de reformas que já têm sido adotadas, por conta dos impactos fiscais. “As medidas que têm sido discutidas são aquelas que já estavam na pauta antes. Flexibilização do contrato de trabalho, facilidade demissão, congelamento de salários… A pandemia só cria a possibilidade.”

De acordo com ele, o bem-estar da população nunca é prioritário. “Espero que as pessoas percebam, com esta crise, que o Estado não tem amarras para fazer políticas de bem-estar social. O que ele não tem é vontade.”

Segundo o professor, os empresários têm poder de pressão e a população acaba por defender pautas que não são dela. “Não vejo como a população poderia se proteger dos pacotes econômicos para pagar a conta, no futuro.” Pessimista, Everton prevê mais recessão e ainda mais regressão nos índices de desenvolvimento humano.