Ministro do STF suspende todas as leis municipais que autorizam funcionamento de bets
Kassio Nunes Marques argumenta que legislações locais dificultam uniformização de regras

O ministro Kassio Nunes Marques, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspendeu nesta quarta-feira (3) todas as leis municipais no território nacional que autorizam o funcionamento de loterias e apostas esportivas online, as chamadas bets. A decisão também suspende todas as licitações decorrentes dessas legislações. O relator também encaminhou a decisão para ser referendada pelo plenário da corte.
De acordo com o magistrado, cabe a atuação do Supremo no caso diante da profusão de normas idênticas em municipalidades do país, o que afeta o ordenamento jurídico nacional e, em última instância, a estabilidade do pacto federativo.
No caso de descumprimento da determinação, o ministro impõe ainda multa de R$ 500 mil por dia aos municípios e às empresas que continuarem prestando o serviço de loteria e R$ 50 mil por dia a prefeitos e presidentes das empresas credenciadas.
A decisão também intimou a Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e a Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL) para que adotem as providências e ações cabíveis.
O pedido foi feito pelo Solidariedade em 12 de março deste ano. O partido pede a inconstitucionalidade de todas os atos normativos que fixaram sistema de loteria, sorteio ou apostas próprio.
As prefeituras citadas no processo argumentam a autonomia do ente público e a competência para explorar os serviços lotéricos, considerando que seriam uma estratégia essencial para o fortalecimento da arrecadação tributária e financiamento de políticas públicas voltadas ao interesse da sociedade, como a seguridade social.
Segundo o relator, somente em 2025, após o ajuizamento da ação, cerca de 55 municípios, de 17 estados diferentes, criaram loterias com o objetivo de explorar as modalidades lotéricas e apostas esportivas.
“O chancelamento dessa sistemática difusa e pulverizada pelo Executivo federal, bem assim flexibilizar padrões e critérios com o intuito de atrair investimento e arrecadação para o ente e dificultar a uniformização de parâmetros e regras publicitárias e de tutela dos direitos do consumidor e da saúde do usuário”, diz Kassio, na decisão.
Segundo o ministro, a Constituição Federal atribui a competência aos muniípios, no tema, para legislar sobre assuntos de interesse local, suplementar a legislação federal e a estadual no que couber; e organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local.
“Em todas as hipóteses, o parâmetro é único: aos municípios é dado legislar e prestar serviço público no limite de seu interesse local e desde que o regramento seja harmônico com o federal e o estadual. Indaga-se: a exploração material-administrativa dos serviços públicos de loteria é também de interesse local?”, pontua o relator.
Para ele, a resposta é negativa. Isso porque as atividades de loteria, sobretudo a modalidade de apostas de quota fixa, não se relacionam diretamente com determinada necessidade imediata de seus cidadãos ou do próprio ente político.
“Ainda que a utilização dos serviços lotéricos esteja em franca ascensão, o princípio da realidade evidencia o contrário: a regulação do mercado, a fiscalização do serviço fornecido e a proteção dos direitos fundamentais do usuário extrapolam – e muito – os limites do interesse municipal”, afirma.
*Via Folha de São Paulo