Advogados contestam autuação da PRF contra comboio com mais de 400 motos, em Goiás
Abordagem resultou em infração gravíssima, com aplicação de multa de R$ 2.934,70, bem como a suspensão do direito de dirigir

A abordagem da Polícia Rodoviária Federal (PRF) que resultou na autuação de mais de 400 motociclistas no último domingo (19), na BR-060, próximo a Abadiânia, é alvo de contestação por advogados especialistas em direito de trânsito. Os condutores participavam de um passeio comemorativo pelos cinco anos do motogrupo “Os Brabos Tem Nome”, quando foram multados com base no Artigo 174 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), dispositivo que pune a realização de eventos, competições ou demonstrações de manobras em vias públicas sem autorização prévia.
A operação gerou mais de R$ 1 milhão em multas e a suspensão das Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs) dos motociclistas. A PRF classificou a ação como uma fiscalização de rotina, mas a forma como foi conduzida levantou dúvidas sobre a legalidade do procedimento.
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Para o advogado Rafael Borges, especialista em direito de trânsito há mais de 10 anos, a atuação da PRF careceu de estrutura adequada. “O errado não pode ser fiscalizado errado”, diz antes de considerar que “a forma que a PRF fiscalizou o comboio é questionável”. “Se o Estado entende que precisa autuar um grupo de 400 motos, é necessário investir em estrutura adequada para isso. Se não tem condições de fazer da maneira correta, então é melhor não fazer”, defende.
Borges reconhece que o deslocamento em massa requer autorização prévia, mas critica o método utilizado pelos agentes. “Tirar foto das placas e liberar todas as motos no mesmo instante não faz sentido. Se a ideia é garantir a segurança viária, não há lógica em agir dessa forma. Isso transmite à sociedade a sensação de que a prioridade não é a segurança, e sim a arrecadação”, completou.
“Autuar em massa, sem abordagem individual, sem identificar o condutor e sem contextualizar a conduta, viola princípios constitucionais da legalidade, da razoabilidade e do devido processo legal, além de gerar insegurança jurídica e desconfiança nas instituições. A justificativa de que ‘eram muitas motos’ não é suficiente. Se o efetivo é pequeno, que se amplie o número de agentes, mas sem sacrificar o direito de cada cidadão ser fiscalizado de forma justa e dentro da lei”, defende o jurista.
Já o advogado Marcos Vinícius Rodrigues, também especialista em trânsito, reforça a crítica ao modo de fiscalização, destacando que não havia qualquer indício de irregularidade no deslocamento. “As pessoas estavam simplesmente circulando na via. Não havia ali nenhum evento, comemoração ou comportamento atípico. Uma autuação como essa requer abordagem individualizada, com identificação do condutor, o que não ocorreu”, explicou.
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Segundo Rodrigues, a ausência desses requisitos pode garantir a nulidade das penas. “Houve negligência, já que nem todos que passavam por ali participavam do passeio”, afirmou. De acordo com o advogado, o caminho a ser seguido deve ser, primeiro, apresentar um recurso administrativo. “Caso o resultado não seja satisfatório, ai sim cabe ingressar com o pedido em vias judiciais”.
Em nome do grupo
De acordo com Monrara Ribeiro, uma das administradoras do moto grupo autuado, neste momento os motociclistas estão ingressando com os recursos administrativos individuais, mas estudam uma ação coletiva para contestar as penalidades.
“Muitos receberam duas multas no mesmo horário e local, o que mostra falhas claras no processo. Nenhum condutor foi informado das autuações no momento da abordagem. Os agentes apenas fotografaram as placas. Disseram que era uma abordagem de rotina, mas depois vimos que não era”, relatou.
Ela também reforçou que o passeio foi pacífico e respeitou todas as normas de trânsito. “Todos pagaram pedágios, passaram pelos postos da PRF de Goiânia normalmente e respeitaram os limites de velocidade. Não vamos aceitar essa injustiça”, afirmou.
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O que diz a PRF
Em nota à imprensa, a Polícia Rodoviária Federal, diz que priorizando a segurança e a fluidez do trânsito nas rodovias federais, foram tomadas as medidas administrativas cabíveis em relação aos condutores que participaram do “grande deslocamento de motocicletas sem a devida autorização”.
“A participação em eventos dessa natureza sem a permissão formal caracteriza uma infração de natureza gravíssima, sujeitando os envolvidos às penalidades previstas no CTB. A PRF reitera a importância do planejamento e da segurança. Qualquer concentração, evento ou comboio que envolva veículos e possa afetar o fluxo normal das rodovias federais deve, obrigatoriamente, possuir a autorização prévia que cumpra as determinações do CTB”, diz um trecho do documento.
Por fim, a PRF acrescenta que o objetivo da fiscalização é “preservar a vida e a ordem no trânsito, evitando riscos desnecessários a todos que utilizam a via”.