Como o acidente com Césio-137 em Goiânia transformou o controle da radiação no Brasil
O Mais Goiás conversou com Walter Ferreira, da CNEN, sobre segurança atual de materiais radioativos

Há 38 anos, os olhos do mundo se voltaram para Goiânia com o acidente do Césio-137. O dia 13 de setembro marcou o início de mudanças no Brasil na segurança do uso de materiais radioativos e equipamentos com radiação. O país reforçou endureceu as regras para o uso de materiais radioativos, com uma fiscalização mais rigorosa e planos de emergência para evitar que tragédias parecidas aconteçam de novo. O Mais Goiás conversou com Walter Mendes Ferreira, que trabalhou diretamente no acidente e chefe da divisão de rejeitos da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), responsável pelo controle desses materiais. “Os erros de 1987 levaram a mudanças profundas na forma como equipamentos e resíduos radioativos são monitorados, transportados e descartados”, disse.
Ferreira explica que o material perigoso envolvido era o Césio-137, um isótopo radioativo artificial. “A fonte de Césio do acidente de Goiânia estava na forma de cloreto de césio, um sal branco altamente solúvel, com uma massa de 19,26 gramas. A fonte possuía uma atividade na época do acidente de 1.375 curies, equivalente a 50,9 terabecqueréis (TBq), [o que significa que liberava trilhões de partículas radioativas por segundo]. Apesar do tamanho pequeno, a radiação era suficiente para causar uma grande tragédia”, detalhou. “A cápsula foi violada e o material se espalhou por vários pontos da cidade, gerando cerca de 6 mil toneladas de resíduos contaminados.”

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Desde então, o país adotou medidas mais rigorosas. Clínicas, hospitais e indústrias que usam materiais radioativos são fiscalizados regularmente. Há regras claras para transporte e descarte seguro, e profissionais recebem treinamento para lidar com esses materiais. Também foram criados depósitos especiais, como o de Abadia de Goiás, onde os resíduos do acidente estão guardados com segurança.
Ferreira detalha que foi preciso estudar muito o destino de todo material contaminado, que precisava de um local com estrutura adequada e terreno específico. “Eles foram armazenados inicialmente em um depósito provisório até o final de 1997. Em 1998, foi construído o depósito final dos rejeitos. Os principais requisitos para a escolha do local foram: a geografia do terreno, a geomorfologia, a geologia, a geotecnia, a hidrologia, a facilidade para implementar serviços básicos como eletricidade e água, instalações sanitárias, obras civis, incluindo tipo de construção, e vias de acesso”, explicou.
A Cnen também reorganizou suas normas, exigindo licenças para operar equipamentos com radiação e a presença de supervisores de proteção radiológica. Em 2025, uma nova norma atualizou ainda mais as regras para transporte seguro e rastreio de materiais radioativos.

Treinamento e equipes prontas para emergências
Para o órgão, o maior problema que o acidente revelou foi o destino errado de equipamentos desativados, que até então não tinham um controle tão rigoroso quanto ao perigo que causam. Isso levou à criação de um programa que não só controla, mas também monitora ativamente esses equipamentos. Hoje, qualquer aparelho com radiação só pode ser descartado com autorização da Cnen e passa por tratamento especial.
A fiscalização é feita junto com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), que acompanham o transporte de cargas perigosas e evitam que o material radioativo circule irregularmente.
Ferreira explica que o Centro de Informações da Cnem tem o papel de fornecer à sociedade, por meio de palestras e cursos, informações sobre a tecnologia nuclear, sua utilização e sobre o acidente com a fonte de Césio-137, além dos aprendizados que o acidente trouxe não só para o estado, mas para o mundo. “No Centro, são oferecidos conteúdos educativos para toda a população, com foco especial em escolas e universidades de diferentes níveis de ensino, mediante agendamento prévio, garantindo que estudantes e professores possam compreender os riscos e aprendizados relacionados à radiação e à segurança nuclear”, detalhou.
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