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Gaza: Comissário da ONU pede investigação após 300 corpos serem encontrados em valas comuns

Cadáveres apresentavam indícios de tortura

Um dia após funcionários da Defesa Civil da Faixa de Gaza terem anunciado a descoberta de quase 300 corpos em uma vala comum no hospital Nasser, no sul do enclave, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Turk, disse estar “horrorizado” com os relatos. Em sessão informativa da ONU nesta terça-feira e por meio de um porta-voz, ele lamentou a destruição das instalações médicas da unidade e de al-Shifa, o maior complexo médico do território e alvo de incursões do Exército de Israel, além dos ataques dos últimos dias em Gaza, que, segundo ele, mataram mulheres e crianças.

Turk exigiu “investigações independentes, eficazes e transparentes” sobre o ocorrido, acrescentando que, “dado o clima de impunidade reinante, os investigadores internacionais devem participar do processo”. Segundo Ravina Shamdasani, porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, as vítimas “foram enterradas profundamente no solo e cobertas de lixo”, e havia idosos, mulheres, crianças e jovens entre os cadáveres. Alguns, disse, foram achados “com as mãos amarradas e sem roupa”. Para o porta-voz da Defesa Civil de Gaza, Mahmund Basal, estas são evidências que indicam que eles “sofreram tortura e abusos”.

Também nesta terça-feira, autoridades do enclave disseram ter recuperado mais 35 corpos nas últimas 24 horas, elevando o total encontrado para 310. Moradores relataram à agência Reuters que tropas israelenses enterraram corpos no local com escavadeiras. O Exército de Israel, por sua vez, afirmou que suas tropas desenterraram alguns corpos da região e os enterraram novamente para garantir que não havia reféns entre eles. Conforme a Associated Press, a área de sepultamento no hospital Nasser foi construída quando o Exército ocupou a instalação no mês passado. Na ocasião, as pessoas não conseguiam enterrar os mortos em um cemitério e, por isso, cavaram covas no pátio do hospital.

À CNN, o coronel Yamen Abu Suleiman, diretor da Defesa Civil na cidade palestina, disse que alguns dos cadáveres tinham sinais de execução, e que não era possível determinar se eles foram enterrados vivos ou mortos. Ele pontuou, ainda, que a maior parte dos corpos já estava em decomposição, o que dificultou o processo de identificação. Funcionários da Defesa Civil desenterraram os restos mortais perto do hospital, e moradores do enclave tentaram encontrar parentes desaparecidos, alguns há mais de um mês. Segundo a rede catari al-Jazeera, outra vala comum foi achada no hospital al-Shifa na última semana.

— Recuperamos 283 corpos de mártires da vala comum no pátio do Complexo Médico Nasser desde a retirada do Exército israelense [no início do mês] — disse Suleiman à CNN nesta segunda-feira, acrescentando que ainda há 2 mil pessoas desaparecidas apenas em Khan Younis, além de outras mil na região central do território, que ainda não foram recuperados por falta de condições e equipamentos para remover os destroços das construções danificadas por intensos bombardeios.

Os corpos foram encontrados depois que militares israelenses saíram do hospital, que abrigava milhares de palestinos deslocados. A última incursão ocorreu no mês passado sob a justificativa de que as autoridades de Tel Aviv tinham “informações confiáveis de uma série de fontes, incluindo de reféns libertados”, de que o grupo terrorista Hamas já havia mantido sequestrados no local. As evidências, porém, não foram divulgadas. Na ocasião, o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas desde 2007, declarou que “a ocupação israelense” invadiu o hospital e o transformou num “quartel militar”.

Em março, dias após as Forças Armadas israelenses iniciarem um ataque contra o Hamas dentro e ao redor do hospital al-Shifa, veículos militares cercaram o Nasser e o al-Amal. Segundo o Crescente Vermelho Palestino, bombardeios pesados e tiros ecoaram na área, e ao menos um trabalhador voluntário do hospital foi morto pelo Exército. Mensagens transmitidas por drones, acrescentou a organização, exigiam que todos saíssem nus de al-Amal, que teve suas portas bloqueadas e barricadas feitas com sacos de lixo. A ONG declarou, na época, que todas as suas equipes estavam “sob extremo perigo” e não podiam se mover.

Um mês antes, também durante uma invasão ao Complexo Médico Nasser, a Organização Mundial da Saúde (OMS) chegou a declarar que o local não era mais “funcional” – ainda que, na ocasião, abrigasse 200 pacientes. Diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom afirmou, naquele contexto, que equipes da organização não foram autorizadas a entrar no hospital para “avaliar as condições dos pacientes e as necessidades críticas”. Até então, a unidade era a maior em funcionamento no enclave. O hospital, porém, não pode mais atender pacientes que precisam de cuidados intensivos e foi prejudicado por cortes de água e eletricidade.

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*VIA O GLOBO