Pets são os novos filhos? Cada vez mais pessoas escolhem animais em vez de crianças
Relação entre humanos e animais de estimação passou por transformações profundas

Perfis no Instagram dedicados exclusivamente a eles. Creches que os recebem durante o dia, como se fossem escolas infantis, e hotéis para quando os tutores viajam. Terapia e adestramento para corrigir comportamentos, roupas para cada estação, sapatos, fantasias e até festas de aniversário. Os pets ganharam status de membros da família — e, para muitos, já ocupam o lugar dos filhos. Essa tendência de pessoas que preferem animais a crianças cresce no mundo todo, inclusive no Brasil.
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Nos últimos anos, a relação entre humanos e animais de estimação passou por transformações profundas. O fenômeno de tratar os bichinhos como filhos — conhecido como humanização dos pets — se tornou parte da rotina em muitos lares urbanos. A mudança desperta debates sobre os limites entre o cuidado saudável e o exagero, além de levantar reflexões sobre o impacto desse comportamento para tutores e animais.
— Outro dia vi um casal empurrando um carrinho e pensei que era um bebê. Quando olhei melhor, era um cachorrinho — conta Magdalena Vionnet, 80 anos, de Buenos Aires. — Hoje em dia se veem mais carrinhos de cães do que de bebês — acrescenta a psicóloga Mariana Kerestezachi, 45.
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Embora mais evidente em cidades como Tóquio, Milão e Los Angeles, o fenômeno de criar pets como filhos é global. Especialistas apontam como causas a busca por liberdade, a recusa a compromissos duradouros, o alto custo de criar uma criança e até preocupações ambientais.
— As famílias multiespécies estão cada vez mais comuns — explica a terapeuta Yulieth Cuadrado. Segundo pesquisa da GfK, Brasil, México e Argentina estão entre os países com mais animais de estimação por família.
Mais liberdade, menos compromisso — sem abrir mão do afeto
Antigamente, a realização pessoal estava ligada à ideia de ter filhos e formar uma grande família. Hoje, a felicidade se conecta muito mais à autonomia individual. Nesse contexto, adotar um cachorro ou gato surge como uma forma de cuidar e amar outro ser — mas sem abrir mão da liberdade.
— Os animais não exigem tanto quanto os humanos. Cuidar deles é mais simples e permite uma vida mais flexível — diz Nicolás Andersson, 31, psicólogo e tutor de dois buldogues franceses. — O amor é o mesmo, só que sem trocar fraldas nem acordar cedo pra levar na escola.
A designer Lucía Bandol, 36, também compartilha essa visão:
— Sempre soube que não queria ter filhos. Tenho dois gatos e não me falta amor. Cuidar deles me faz feliz — afirma.
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Benefícios emocionais e vínculos afetivos
Cuidar de um pet pode trazer benefícios reais para a saúde mental. De acordo com o National Institutes of Health (NIH), os animais de estimação ajudam a reduzir o estresse, melhoram o coração, estimulam habilidades sociais e fortalecem o senso de responsabilidade.
— Quando olhamos para nossos pets, o cérebro libera oxitocina, o hormônio do amor — explica Cuadrado. — Isso melhora o humor e reduz o cortisol, o hormônio do estresse.
Mas há um limite. Especialistas alertam que a humanização excessiva pode gerar dependência emocional, tanto no tutor quanto no animal. Quando o pet se torna o principal canal de afeto, ele pode ser sobrecarregado por expectativas humanas e acabar sofrendo com ansiedade ou comportamento agressivo.
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Amor responsável x exagero
Demonstrar amor é essencial, mas deve vir acompanhado de respeito às necessidades da espécie. O amor responsável inclui alimentação adequada, consultas veterinárias e estímulos físicos e mentais. Já o exagero aparece quando o tutor ignora a natureza do animal e o trata como uma criança, impondo roupas, doces e hábitos que fazem mal à saúde e ao comportamento.
Veterinários alertam que a superproteção e a falta de socialização com outros animais podem gerar distúrbios comportamentais. “O carinho é bem-vindo, mas os limites precisam existir”, reforçam especialistas.
Fator econômico e pessimismo com o futuro
Outro ponto que influencia essa escolha é o fator econômico. Criar filhos exige estabilidade financeira, educação, moradia e saúde — algo distante da realidade de muitos jovens.
— Ter filhos é caro, e ganhar dinheiro é difícil. Os pets dão menos trabalho e custam bem menos — diz Ignacio Martínez Larrea, 20 anos.
Além disso, o pessimismo em relação ao futuro do planeta pesa na decisão.
— Com tantas crises ambientais e sociais, não acho razoável trazer alguém ao mundo para sofrer — afirma Bandol.
*Com informações do O Globo e E.M Foco