Absurdo

Amazônia: satélites registram 1.476 km² de desmatamento em julho

Julho de 2022 foi, pelo menos, o sexto mês com mais alertas de desmatamento desde…

Amazônia começa a colapsar em 2050, diz estudo 10% a 47% da mata remanescente podem não ter umidade suficiente
Foto: Bruno Kelly - Amazônia Real

Julho de 2022 foi, pelo menos, o sexto mês com mais alertas de desmatamento desde o início da atual gestão do governo federal. Ainda faltam os dois últimos dias do mês para serem computados, mas os dados do sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), indicam que foi derrubada uma área de 1.476 km² de florestas no período.

Julho é tradicionalmente o mês com pior taxa, porque fica no meio da estação de clima seco na Amazônia, o que facilita a ação dos desmatadores. Com os dados quase completos, o ano-referência de medição do desmate (período que vai de agosto de um ano a julho do ano seguinte), soma 8.581 km² devastados.

O número é similar ao do ano passado, quando o país registrou a pior taxa de desmate em 15 anos. O Deter, entretanto, não é a ferramenta que o Inpe usa para medir com precisão o desmatamento em período anual. Essa função cabe a outro projeto, o Prodes, que só deve terminar de compilar dados e processá-lis em novembro.

Nos últimos cinco anos, o Deter tem conseguido capturar em média dois terços do desmatamento mapeado pelo Prodes, que é menos vulnerável à presença de nuvens na captação de imagens. Se essa taxa de variação se mantiver, o desmate na Amazônia terá sido cerca 12.500 km² em um ano, ou algo entre 10.000 km² e 14.000 km².

Qualquer que seja o resultado final, esses números estão ainda muito acima dos compromissos que o Brasil assumiu internacionalmente sobre emissões de CO2, porque a perda de florestas é a principal fonte de emissões de gases do efeito estufa pelo país.

O Brasil está hoje fora da trajetória para cumprir a meta de zerar o desmate até 2030 e fora da trajetória de reduzir as emissões de gases-estufa em 37% entre 2005 e 2025, objetivo que assumiu dentro do Acordo de Paris.

O Ministério do Meio Ambiente não emitiu nenhum comentário sobre os números novos do Deter até as 8h30 da manhã desta sexta. O Inpe publicou os dados, mas não emitiu nenhuma análise qualitativa. Até as eleições de outubro o instituto está em período de “silêncio eleitoral”, previsto em lei, durante o qual entes públicos não devem propagar comunicados que tenham efeito sobre a imagem do órgão ou do governo.

O desmatamento da Amazônia no primeiro semestre foi 7% maior que no mesmo período em 2021, quando atingiu 5.106,1 km². No Cerrado, o outro bioma que é monitorado pelo sistema Deter, o desmate também foi alto, com 4.091 km² desmatados neste ano até julho, um aumento de 28% em relação ao mesmo período no ano passado.

‘Tendência inequívoca’

Os números novos do Deter já provocaram a reação de algumas ONGs ambientalistas.

“Os últimos quatro anos e meio estão mostrando uma tendência inequívoca de aumento crescente da destruição da Amazônia, destruição esta que não está gerando emprego, renda ou elevando a qualidade de vida de quem mora na região”, afirmou em nota Edegar de Oliveira, diretor de conservação e restauração da WWF no Brasil.

“Com Bolsonaro, a Amazônia inevitavelmente caminhará para seu ponto de colapso. Qualquer solução para a floresta começa em outubro, nas urnas”, diz Márcio Astrini, secretário-geral do Observatório do Clima, coalizão que reúne as ONGs ambientais mais atuantes do país.

Beto Mesquita, pesquisador do grupo estratégico da Coalizão Brasil, Clima, Florestas e Agricultura, destaca que a perda de cobertura vegetal no país deve se refletir em perda de serviços ecossistêmicos.

“Somando o desmatamento na Amazônia e no Cerrado, ao longo de 12 meses, temos 12.600 km2 desmatados. Com essa vegetação perdida, esse patrimônio natural, colocamos em risco a regulação do clima, o regime de chuvas, a disponibilidade hídrica tanto para o agronegócio quanto para o abastecimento das cidades”, afirmou.

Efeito eleitoral

Os estados com maiores áreas de alertas de desmatamento no deter no período 2021-2022 foram o Pará (3.070 km2) e o Amazonas (2.288,7 km2), somando 62,5% do desmatamento total da Amazônia Legal. Uma quantidade muito grande dos focos se concentram no entorno da BR-230, a rododovia Transamazônica.

Os dois municípios que mais desmataram são no sudeste amazonense: Lábrea, com 571 km² e Apuí, com 566,4 km², onde a rodovia acaba. Segundo especialistas, a aceleração do desmate que ocorre agora tem relação não apenas com a estação seca.

— Em ano de eleição é quando, normalmente, você tem uma maior taxa de desmatamento, porque começam [os candidatos da região] a assumir o compromisso de não apertar a fiscalização — afirma Britaldo Soares-Filho, especialista em modelagem ambiental e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Tradicionalmente, a proximidade do pleito, leva não apenas a um relaxamento da fiscalização e ao desmate ‘especulativo’ quando proprietários de terra e grileiros correm para derrubar árvores temendo que a fiscalização se intensifique no mandato seguinte.

Segundo Tasso Azevedo, coordenador do projeto MabBiomas, que monitora a cobertura terrestre do Brasil, ainda que o ambiente de incerteza eleitoral possa provocar uma corrida pelo desmate, é importante que candidatos comprometidos com a causa sinalizem que vão embargar e multar propriedades com desmate ilegal.

— Boa parte do problema do desmatamento tem relação com o sinal que é dado pelo poder público, e isso vale não só para a Amazônia, mas para o Brasil todo — afirma o cientista.