Economia

Sem fonte de recurso, Renda Cidadã deve ficar para depois da eleição

A dificuldade para encontrar uma fonte de recursos para tirar do papel o Renda Cidadã,…

A dificuldade para encontrar uma fonte de recursos para tirar do papel o Renda Cidadã, que vai substituir o Bolsa Família, deve fazer com que o martelo sobre o novo programa só seja batido efetivamente após as eleições municipais de novembro.

O impasse em torno do lançamento do Renda Cidadã, como o programa tem sido chamado agora, fez até com que o vice-presidente Hamilton Mourão defendesse na quinta-feira (1) a criação de um imposto para bancar os custos e deixar essa despesa de fora da regra que limita o avanço dos gastos públicos.

— Vamos olhar uma coisa aqui de uma forma muito clara. Se você quer colocar em um programa social mais recursos do que o existente, você só tem duas direções: ou você vai cortar gastos de outras áreas e transferir esses recursos para esse programa ou, então, você vai sentar com o Congresso e propor algo diferente, uma outra manobra que seja, por exemplo, fora do teto de gastos, um imposto específico para isso e que seja aceito pela sociedade como um todo. Não tem outra solução, ou então mantém o status quo — disse Mourão.

Durante apresentação em uma rede social, o presidente Jair Bolsonaro falou nesta quinta-feira (1) sobre a importância de manter algum tipo de auxílio para a parcela mais carente da população, mas não comentou sobre uma possível fonte de financiamento do novo programa.

— Nós sabemos que (…) acaba em dezembro o auxílio emergencial e a economia pode não ter pegado até lá. Temos 38 milhões de informais, atualmente chamam de invisíveis e nem todos vão conseguir voltar ao mercado — disse o presidente ao comentar a dificuldade do governo em estabelecer de onde poderá tirar recursos para financiar o novo programa social.

Na mesma transmissão, Bolsonaro reforçou sua confiança no ministro da Economia, Paulo Guedes, dizendo que ele “é o cara” da política econômica e que tem palavra final:

— Paulo Guedes continua 99,9% de confiança comigo. Deixo 0,1% porque às vezes, eu quero mudar alguma coisinha eu falo com ele: “Qual é, pô? Você quer tudo pra você, pô? Você é muito guloso — afirmou.

Proposta ‘esdrúxula’

A equipe econômica sustenta que a solução ideal para viabilizar o novo Bolsa Família seria a consolidação de outros programas considerados menos eficientes em um só. Isso envolveria, por exemplo, rever as regras do abono salarial, restringindo o acesso ao benefício.

Essa proposta, entretanto, foi a primeira oferecida por Paulo Guedes ao presidente, que criticou publicamente a ideia. Por isso, os integrantes da equipe defendem, nos bastidores, que seria importante aguardar o momento certo para voltar a discutir sobre o tema.

No início da semana, integrantes do governo e líderes do Congresso propuseram adiar o pagamento de dívidas judiciais (os chamados precatórios) para custear o Renda Cidadã, nome que tem sido usado, até agora, para o novo Bolsa Família. A ideia foi mal recebida por analistas do mercado financeiro e economistas, o que fez com que Guedes descartasse o plano — embora ele tenha participado do anúncio oficial da medida.

Para o ministro, o novo programa não pode ser financiado com um “puxadinho”. Nesta quinta-feira (1), o assessor especial do ministro, Guilherme Afif Domingos, reforçou a crítica e disse que a proposta era “esdrúxula” e não foi apresentada pela pasta.

O recuo de Guedes fez com que a fonte de financiamento do programa voltasse a ser uma incógnita, discutida em diferentes frentes no Executivo e no Legislativo.

No Congresso, o clima é de desconforto com a reação do ministro a uma proposta da qual ele participou da costura nos bastidores.

A estratégia entre líderes é aumentar o suporte político e técnico ao senador Marcio Bittar (MDB-AC), relator da proposta de criação do programa, que vinha mantendo um alinhamento com Guedes. Não está descartada a possibilidade de que o parlamentar apresente um texto nas próximas semanas, mesmo sem apoio da equipe econômica.

— É daqui desse ministério que vai ser criado esse novo programa, cheio de ideias inovadoras, que incentivarão as famílias que tiverem os filhos na escola e que tirarem boas notas, assim como vários incentivos para que as pessoas que entrarem no programa queiram a carteira assinada — afirmou o senador nesta quinta-feira (1), em um video nas redes sociais ao lado do ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni. Procurado pela reportagem, o senador não atendeu aos pedidos de entrevista.

O vídeo foi a primeira declaração de Bittar desde que participou de uma reunião na quarta-feira no Palácio do Planalto com Guedes, secretários da equipe econômica e líderes do Congresso. Desde então, parlamentares têm optado pelo silêncio em relação ao tema.
Impasse fiscal

A criação de um tributo para bancar o novo programa, como sugeriu Mourão, vem sendo debatida nos bastidores do Congresso há semanas, mas não é suficiente para resolver o problema. O imposto até pode ser indicado como fonte de financiamento — uma exigência constitucional para a criação de qualquer tipo de benefício.

No entanto, não resolve a limitação imposta pelo teto de gastos, que impede que as despesas primárias cresçam mais que a inflação do ano anterior. O problema é que a previsão de gastos para o ano que vem já está nesse limite.

Mesmo com um aumento na arrecadação, seria necessário abrir uma exceção na legislação do teto para que o novo gasto financiado com essa nova receita não fique sujeito à trava fiscal.