SÉRIE ESPECIAL | NA MIRA DO DESPEJO

Alto da Boa Vista: “que não tenhamos outro Parque Oeste Industrial”

A Ocupação Alto da Boa Vista, em Aparecida de Goiânia, é constituída, basicamente, por pessoas…

“Que não tenhamos outro Parque Oeste Industrial”
“Que não tenhamos outro Parque Oeste Industrial”

A Ocupação Alto da Boa Vista, em Aparecida de Goiânia, é constituída, basicamente, por pessoas carentes. São mães solteiras sem condição de pagar aluguel, pais de família desempregados, crianças, idosos e pessoas com deficiência. Em comum, eles têm o desamparo. Quem se comove, ajuda. A assistente social Any Borba é uma dessas pessoas – ela, inclusive, garantiu bolsas de estudo para crianças da ocupação em uma escola privada. Particularmente, ela tem um medo: que um novo episódio de violência, aos moldes do que aconteceu na ocupação do Parque Oeste Industrial ocorra ali.

O temor da assistente social é que aconteça outro massacre. “E se acontecer ali, o dano vai ser maior. Porque lá é distante, não dentro de Goiânia, com muito movimento”. Segundo Any, só vai no Alto da Boa Vista quem tem que ir. “Não tem rua, não tem asfalto, é em um canto perto da mata. Se a polícia chegar ali e cercar vai ser um massacre muito pior, porque eles estão na periferia da periferia”.

Para ela, muito mais gente pode morrer se a polícia fechar o local. “Porque a polícia está muito violenta. Que não tenhamos outra história do Parque Oeste para contar nesse Estado.”  A ocupação está localizada às margens da Avenida Cristus, na Vila Delfiori.

Dignos

Atuante em uma unidade de ensino no Bairro Madre Germana, também em Aparecida de Goiânia, ela faz parte do Conselho Municipal de Direito. Sobre a situação dos moradores, ela avalia que a maioria vive em condição sub-humana, mas não compra a ideia de que falta dignidade.

“Eles vivem, sim, com dignidade. A barraca que eles construíram foi com o desejo de ter a casa própria, com muita luta. Quem luta é só quem tem dignidade”, avalia. Segundo ela, quem não aceita ser humilhado pelo estado ou qualquer pessoa é um cidadão digno. “Eles plantam juntos, tem cuidado um com os outros, fazem assembleias, tudo ganha no coletivo, querem, construir tudo junto”, elogia.

Ainda assim, ela se preocupa. “Não tem água, tem um poço artesiano que oferece água por mangueiras. A energia elétrica é um risco”, avalia. “São barracas de lona”, diz sobre boa parte dos ocupantes. Desta forma, Any declara que a condição em que essa comunidade, hoje, vive, também é responsabilidade do Estado. Ela informa que eles estão lutando há dois anos e o Estado não os ouviu. “Só ouviu quando alguém disse que era dono da terra, antes disso, nada”.

Mas garante: “Por mais difícil que seja a condição de vida deles, é mais digno do que não ter lugar para ficar, não ter endereço, não ter onde morar…” Para a assistente social, a decisão da juíza pela desocupação e transferência dos extremamente vulneráveis a um galpão é “ridícula”. “Me dispus a fazer a avaliação do local para onde eles podem ser levados. Ainda estou aguardando a notificação técnica”, declara.

Ainda sobre a decisão judicial, Any afirma que o que falta no local é parede de tijolo, “mas isso não demonstra dignidade”. Para ela, muitos vivem em castelos, condomínios fechados, mas não são dignos como os moradores do Alto da Boa Vista.

“Houve um caso de agressão de um marido contra a esposa. Eles não aceitam a violência contra a mulher e nem que elas sejam tratadas com desrespeito. Nas assembleias são elas quem falam primeiro”, destaca o protagonismo.

Antes da série

Leia, ainda, as outras matérias publicadas antes da Série Especial Alto da Boa Vista:

Ato no Terminal Garavelo é organizado em apoio às famílias do Alto do Boa Vista

Em assembleia, moradores da Ocupação Alto da Boa Vista decidem permanecer no local

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Série Especial | Na mira do despejo
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TEXTO 2: Alto da Boa Vista: hospitalidade, alegria e desejo de continuar sob um teto
TEXTO 3: Alto da Boa Vista em análise: a Justiça decidiu pela desocupação
TEXTO 4: Alto da Boa Vista: como no Parque Oeste Industrial
TEXTO 5: Alto da Boa Vista: ocupação que é comunidade