Força-tarefa

Com infraestrutura precária, mais de 8 mil barragens goianas estão sem cadastro

O crime ambiental por trás do rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho-MG, na…

O crime ambiental por trás do rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho-MG, na última sexta-feira (25), trouxe à pauta das autoridades goianas a necessidade do monitoramento e fiscalização das cerca de 9 mil estruturas de contenção existentes no Estado. Desse total, de acordo com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos (Secima), apenas as 200 maiores estão devidamente cadastradas no Sistema Nacional de Segurança de Barragens, sob a gestão da Agência Nacional de Águas (ANA), e apenas 11 – voltadas a atividade de mineração e submetidas à Agência Nacional de Mineração (ANM) – foram vistoriadas desde 2017.

Diante dos casos de Mariana, em 2015, e agora de Brumadinho, a titular da Secima, Andréa Vulcanis, reuniu uma força-tarefa em parceria com o batalhão ambiental da Polícia Militar (PM). O objetivo é mapear, vistoriar, orientar e adotar medidas preventivas. Atualmente, segundo a própria pasta, apenas três servidores têm treinamento e capacitação relativa à Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) para realizar o serviço nas estruturas registradas. Por isso, nesta semana, o grupo deverá divulgar um plano de ações para reversão do atual quadro.

Dentre as medidas deverão estar providências para que os 9 mil barramentos sejam classificados e devidamente cadastrados. Também está previsto o aumento do número de técnicos, incluindo apoio de engenheiros e demais profissionais da área que compõem o corpo ambiental da PM, com os quais está sendo estabelecido um Acordo de Cooperação Técnica para suprir a deficiência de quadros da Secretaria.

“[Iremos] adotar medidas enérgicas para que os barramentos de Goiás sejam classificados e monitorados com vistas à proteção da população e do meio ambiente goiano. Um plano de ações emergenciais já está em andamento e irá incluir a questão das barragens, bem como à redução dos passivos de análises e pedidos de outorga”, observa Vulcanis. A pasta acumula cerca de 5 mil pedidos de outorga e outros 2 mil requerimentos de licença ambiental para análise.

De acordo com a secretária, entre as razões pelas quais as vistorias não foram intensificadas está a destinação de servidores da área de recursos hídricos e licenciamento ambiental para a contenção da crise hídrica de 2018 em Goiânia. “Os casos de rompimento de barragens de Mariana e Brumadinho demonstram que o licenciamento ambiental como também as outorgas devem ser emitidas de forma criteriosa, o que envolve muitos profissionais nas análises, dada a complexidade da matéria”.

Mauro Borges

Com capacidade para armazenar até 130 bilhões de litros de água, a Barragem Mauro Borges, também conhecida por João Leite, é a maior de Goiás. A estrutura está entre as classificadas pela Secima e, de acordo com a pasta, oferece risco de alto potencial de danos, uma vez que está “acima de uma área urbana povoada.

Por outro lado, informações da Saneago, é baixo o risco de acidentes em razão de ter sido “muito bem projetada”, além de ser monitorada diariamente por técnicos da empresa e outros de uma consultoria especializada contratada para controlar a segurança da barragem. “As informações dão conta de que todas as licenças ambientais da barragem estão em dia e que cumpre todos os requisitos legais pertinentes à segurança”, completa Vulcanis.

Mineração

Estudo do produzido pelo Programa de Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás (UFG) entre os anos de 2016 e 2017, com enfoque no impacto socioambiental provocado por empreendimentos minerários do Estado detectou falhas de organização “preocupantes”, segundo o professor e pesquisador da Faculdade de Direito, Saulo Coelho.

Para ele, a prioridade da Secima deve ser a organização das informações e a transparência delas nos licenciamentos ambientais de grande porte no Estado. “Durante o levantamento, não conseguimos localizar documentos voltados a fiscalizações e, em outros casos, as informações encontram-se em bases de dados distintas. Com isso, nosso potencial de identificar falhas e embasar a edificação de melhorias e licenciamentos fica prejudicado. A pesquisa indica isso”.

De acordo com Relatório do Sistema Nacional de Segurança em Barragens divulgado em 2017, a estrutura para mapeamento das estruturas em Goiás é precária, o que pôde ser confirmado pela pesquisa universitária. “Não há órgão próprio para lidar com isso, são poucos os servidores designados para realizarem monitoramento e fiscalizações e eles ainda compartilham outras tarefas na área ambiental. O assunto não é tratado de forma exclusiva ou prioritária pelo Estado”.

Segundo relatório de 2017, nenhuma das estruturas cadastradas apresentava risco (Fonte: Relatório/RSB)

Apesar da desorganização e falta de transparência das informações nos órgãos estaduais, o dever de informar amplamente a população sobre as condições das barragens está estabelecido na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente. “Antes mesmo da Lei de Acesso à Informação isso já era previsto. É um requisito desses processos que estudos sejam franqueados à população interessada de forma ampla. Esse acesso hoje é desorganizado e algumas das informações estão geridas de forma não integrada – não inteligente –, não sistematizada”.

Para Coelho, o Estado deveria constituir um prontuário para reunir as informações acerca do tema. “Durante as pesquisas, encontramos informações sobre o ato de licenciamento de uma das estruturas, mas não encontramos quais condicionantes foram estabelecidas na contrapartida do contrato, muito menos quais delas foram ou não atendidas. A dificuldade em encontrar dados sobre 15 anos atrás é muito grande, mas em 2004 isso já era lei e estávamos no século 21. É preciso entender tudo o que aconteceu nesses empreendimentos até para poder responsabilizar pessoas quando acontecem problemas”.