Segurança pública

Policiais pedem socorro: suicídio mata mais que confrontos

A Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) recebeu, na última quinta-feira (7), um projeto de lei…

Após Lei, aprovados em cadastro de reserva de 2012 da PMGO aguardam convocação
Após Lei, aprovados em cadastro de reserva de 2012 da PMGO aguardam convocação (Foto: reprodução/Internet)

A Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) recebeu, na última quinta-feira (7), um projeto de lei (PL) que pretende estabelecer um programa de prevenção ao suicídio e automutilação de profissionais da Segurança Pública do Estado. No País, o número de policias que tiraram própria vida, em 2018, foi maior que a de mortos em confronto nas ruas: 104 contra 87 (Estadão Conteúdo).

Segundo a Ouvidoria da Polícia de São Paulo, fatores como estresse da função e conflitos institucionais (assédio moral, por exemplo), contribuem para essa realidade. Em Goiás, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou ao Mais Goiás “que os dados estatísticos de 2018 estão sendo auditados”.

Em nota, a pasta explicou, ainda, que “todos os números e metodologias passarão por rigoroso processo de auditoria. Informamos também que foi instaurando um Inquérito Policial (n° 325/2019). Mais informações serão divulgadas em momento oportuno”.

Por outro lado, deputada Lêda Borges (PSDB), autora do mencionado PL, aponta que houve aumento de 140% no número de suicídios de agentes da segurança pública neste ano, em relação a 2018. Segundo o texto, casos subiram de 28 para 67.

Realidade

Só em maio, em Goiás, ocorreram dois suicídios. Segundo uma fonte de dentro da Polícia Militar, que faz acompanhamento com psiquiatra do Hospital da PM para ansiedade e que preferiu não se identificar, um deles foi o 1º tenente Wellignton. Trata-se de militar reformado, que estava com problemas de saúde. Ele tinha 71 anos. Já o segundo foi o 1º sargento Windson Costa e Silva. Ele chegou a ser socorrido e encaminhado para uma unidade de saúde, mas chegou morto.

Sobre o PM que já estava na reserva, a fonte informou que o agente “desenvolve transtornos durante as atividades policiais e não tem um projeto para desacelerar, para tratar quando aposenta. Então, fica em depressão, cheio de problemas psicológicos e acaba cometendo suicídio”.

A fonte declarou que são vários os casos de policiais que tentam suicídio e ficam internados em clínica psiquiátrica. “Eles desenvolvem depressão, transtorno de bipolaridade, ansiedade acentuada…”. Para ele, infelizmente, na PM tratam de problemas psicológicos, como depressão, como “frescura”. “Não tratam como a devida atenção. Então, o profissional que trabalha armado é um risco pra família, para ele e para a sociedade.”

Promoção

Vereador, Cabo Senna também é policial militar. Além disso, Senna é presidente da Associação União dos Militares de Goiás (Unimil). Ele revela que existe o Hospital da Polícia Militar (HPM), mas que não há eficácia por um motivo. “Para que eu seja promovido preciso estar com saúde. Se eu for no psicólogo e falar que estou com dificuldade, o profissional me coloca na junta”.

Segundo ele, a política da PM inibe as pessoas de procurarem ajuda. “Se esse projeto de lei prever que a busca por ajuda não atrapalhe na promoção, com certeza o policial vai procurar mais por ajuda.”

Ainda assim, ele vê a proposta como algo bom. “Vai defender a vida, que é muito importante”. Ele revela que os transtornos psicológicos existem muito na vida dos policiais, tanto militares quanto civis, pois “o trabalho é de muita pressão. Eu trabalhei 25 anos na rua. Chega um momento que você está tão estressado, que não tem medo de mais nada, nem de morrer”. Para ele, mais importante do que um carro novo ou arma nova é a vida.

Exigência

Ainda de acordo com o Cabo Senna, o Estado, geralmente, quer o resultado final, que é a sociedade defendida. “Pouco se preocupa com o ser humano.”

Ele também disse que a categoria se forma sob muita pressão para não errar. “O Estado esquece que viemos do meio, da sociedade, que erra e acerta. Policiais são humanos. Às vezes parece que existe uma força diferente, que são super-homens, mas não somos. Temos sentimentos”.

Insegurança

Senna revela que alguns policiais ficam muito inseguros, de modo geral (atuação, renda, etc.). Eles sentem que não conseguem dar segurança para a sua família. “Aí vem a fraqueza. Cobra-se muito”, diz ele. “Mas ninguém quer saber se o policial está bem de saúde.”

Apesar de todas as críticas, o cabo da PM fez questão de parabenizar uma medida da corporação, na pessoa do Coronel Rentao Brum, que pode aliviar, um pouco, a tensão. “A PM tem feito um programa chamado PARe – escreve desse jeito, mesmo.”

A grafia, segundo Senna, é para dar a conotação de desaceleração. “Quando a pessoa está perto de se aposentar, já estafada, as funções são readequadas, para o policial ir se acalmando.” Porém, ele faz questão de frisar que se trata de uma medida exclusiva para o fim da carreira. “Mas é uma forma indireta de ajuda.”

Serviço extra remunerado

O serviço extra remunerado ocorre quando o policial antecipa seu plantão e volta ao trabalho. Senna explica que a escala é 24h de trabalho, por 72h de descanso. “E as 24h são sem parar, uma correria atrás da outra.”

Neste serviço, o policial é chamado após 12h – depois desse intervalo, ele pode ser chamado. “Acontece muitas vezes, por conta do efetivo baixo. Não fica com a família, com os filhos”, explica.

O policial informa que o efetivo do Estado deveria ser superior a 30 mil. Porém, atualmente são cerca de 12 mil. Desses, têm aqueles de férias, licença, doentes e de folga. “O serviço extra remunerado supre isso, o que acarreta muitos problemas.”

Posicionamento

A SSP foi procurada, também, para esclarecer acerca de trabalhos voltados para estes profissionais que passam por problemas psicológicos. A pasta solicitou que o portal buscasse cada órgão, individualmente.

A comunicação da Polícia Civil informou que possui um departamento próprio para acompanhamento psicológico destinado aos seus policiais e familiares. O setor é composto por profissionais destinados exclusivamente para este atendimento.

Trata-se da Divisão de Proteção à Saúde do Servidor (DPSS) da Polícia Civil. No site da corporação, é informado que esta “oferece serviços, realizados por equipe multidisciplinar, para prevenção e tratamento de enfermidades ocasionados no exercício da atividade laboral.

Composta pelo Núcleo Integrado de Atenção Biopsicossocial (Niab), Seção de Serviço Social (SSS), Seção de Projetos em Saúde (SPS) e Serviço Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT), a unidade ainda percorre delegacias da capital e interior para orientar os servidores sobre os cuidados com a saúde física e mental”.

A coordenadora do DPSS, Eliane Beppu, destaca que, apesar de muitos agentes e servidores administrativos passarem por estresses físicos e psicológicos, ainda são poucos os procuram suporte. “Temos um serviço de excelência que precisa ser divulgado.” Psicólogos, fisioterapeutas, assistente social, enfermeiros, técnicos e engenheiro de segurança do trabalho fazem parte da equipe.

Outras respostas

Já a comunicação da Polícia Militar informou que, durante o fim de semana, só funciona o plantão. Apenas na segunda-feira (11) será possível um posicionamento sobre esse assunto. A assessoria dos Bombeiros, por sua vez, disse que a companhia possui um Comando de Saúde que cuida dos profissionais e familiares. “Lá há psicólogos e psiquiatras.” Outros detalhes só poderiam ser dados fora do fim de semana.

O Mais Goiás também entrou em contato com a Diretoria-Geral de Administração Penitenciária (DGAP). Foi informado que, atualmente, os servidores contam com o apoio e o acompanhamento dos integrantes do Comitê de Direitos Humanos da DGAP, tendo alguns casos, quando necessários encaminhados para a Junta Médica do Estado, para providências cabíveis.

“O Comitê de Direitos Humanos da DGAP, setor responsável por tratar diretrizes que visam atender melhor às necessidades do servidor do órgão, informa que estão em fase de estudos projetos para melhores acompanhamentos psicológico e social oferecidos ao trabalhador do sistema penitenciário goiano. Os estudos devem resultar na criação de programas que objetivam ampliar as assistências institucionais para esse público.”