Crítica

Desventuras em Série: uma sequência de acertos

Desventuras em Série, novo investimento original da Netflix, baseada na série de romances infanto-juvenis escritos…

Desventuras em Série, novo investimento original da Netflix, baseada na série de romances infanto-juvenis escritos por Daniel Handler sob o pseudônimo de Lemony Snicket, é uma série hiperbólica, com uma estética e humor muito próprios que mesclam o humor negro com o nonsense. Você vai saber logo de cara, talvez até na abertura, se este é um programa para você, ou não.

 

Inspirada na série de 13 livros iniciada em 1999, esta primeira temporada de oito episódios adapta os quatro primeiros livros da saga dos órfãos Violet, Klaus e Sunny Baudelaire, herdeiros de uma gigantesca fortuna, após seus pais serem mortos em um incêndio suspeito. Logo após a tragédia, desgraça após desgraça cai sobre os irmãos, constantemente perseguidos pelo vilão conde Olaf que está atrás de sua herança.

 

Toda a trama é narrada pelo próprio Lemony Snicket que irá insistir, constantemente, para que o telespectador abandone o seriado e vá assistir algo mais feliz, uma provocação muito divertida acompanhada de uma narração muito competente feita por Patrick Warburton. A própria abertura – que é maravilhosa e que muda a cada dois episódios – insiste para que o telespectador não veja a série.

 

O seriado é produzido e estrelado por Neil Patrick Harris, o Barney de How I Met Your Mother, que aqui assume o papel do terrível conde Olaf, um ator de quinta categoria que usa de vários disfarces para tentar enganar os órfãos.

 

Harris está excelente no papel, porém a pegada caricata de Olaf torna difícil separar este personagem do Barney, que era igualmente caricato, exagerado e cheio de disfarces. Se te ajudar, imagine que um personagem virou o outro e que esta é uma versão do Barney vinda direto do inferno.

 

Embora Harris seja o destaque, o resto do elenco é estelar e escolhido a dedo. Não existe sequer um coadjuvante que não está bem em seu papel e isso se estende até mesmo aos capangas de Olaf, quem nem sequer possuem nomes.

 

Os jovens Louis Hynes e Malina Weissman, respectivamente Klaus e Violet, também merecem palmas. Atores mirins sempre são uma aposta que a Netflix parece tirar de letra. Depois do excelente elenco de Stranger Things, Desventuras deu um show com essa dupla que segura a bronca de serem protagonistas com grande facilidade.

 

A grande barreira do programa está em seu estilo estético e em seu humor. Todo o visual mistura o anacrônico e o steampunk com o atual, lembrando um filme de Tim Burton ou Wes Anderson, o que pode não agradar a todos.

 

Fora isso, o roteiro é maravilhoso, cheio de piadas de duplo sentido, referências e mesmo piadas intelectuais misturadas a um humor que beira o pastelão e que é inteiramente sem sentido em alguns momentos. Embora seja maravilhoso para alguns, ele talvez não pegue algumas pessoas que podem achar o roteiro forçado demais ou infantil demais em alguns momentos.

 

E para quem está atento a assuntos pós-modernos como diversidade na televisão, vai ficar muito feliz em saber que a série faz um bom trabalho nesse ramo: há personagens negros em papéis de destaque, muitas mulheres e até mesmo um casal gay no cânone. Fora isso, Violet e Klaus são um espetáculo à parte: ao contrário de estereótipos, Violet é uma grande engenheira, inventora e construtora, enquanto Klaus é a parte Humanas dos irmãos, mais focado em ler, em retórica e pensamento argumentativo.

 

Enfim, Desventuras em Série é uma série muito bonita, terrivelmente divertida e deliciosamente intelectual para todas as idades e mais um grande acerto para a Netflix que, apesar de tudo o que a abertura e o narrador Lemony disserem, você deve sim continuar assistindo.