Resenha

Guardiões da Galáxia Vol. 2 emula fórmula do antecessor com erros e êxitos

À essa altura, a maior parte dos entusiastas ligados aos mundos do cinema e dos…

À essa altura, a maior parte dos entusiastas ligados aos mundos do cinema e dos quadrinhos já ouviu falar que o primeiro filme dos Guardiões da Galáxia representou um grande risco para a Marvel. Integrante de um gênero então decadente, sem elenco ou diretor que naquele momento fossem grandes estrelas e explorando personagens desconhecidos pelo grande público, o sucesso da empreitada era incerto, ainda que se mantivesse ancorada na fórmula aventuresca e bem-humorada do estúdio – unanimemente exitosa.

Mesmo com todas as dúvidas, foi justamente essa mistura improvável, associada a uma boa história, a uma seleção de músicas retrô bem integradas à trama e ao humor escrachado (transgressor para os padrões Disney), que permitiram que o projeto do roteirista e diretor James Gunn caísse nas graças da crítica e do público, chegando ao 3º lugar no ranking de bilheteria em 2014. Assim, não é sem motivo que esse “Volume 2” agregue todo esse conjunto do primeiro filme e o exponencie o que, se garante uma produção divertida e bem estruturada, a prejudica com um peso excessivo sobre esses mesmos elementos.

Nesta sequência, passada alguns meses depois dos eventos do primeiro filme, os guardiões já são uma família consolidada, cada um com suas características e especialidades, o que provoca, inclusive, rivalidades internas. Vivendo juntos, eles são obrigados a aturar as ranhetices uns dos outros enquanto cumprem missões como mercenários em diferentes pontos da galáxia. É em uma dessas “viagens a trabalho” que o Senhor das Estrelas, “nome de guerra” de Peter Quill (Chris Pratt), acaba conhecendo o pai, Ego, o Planeta Vivo (Kurt Russell), e a criatura que vive como criada dele, a empata Mantis (Pom Klementieff).

Tal qual o primeiro filme, o Volume 2 brilha, inclusive, ao destacar as motivações e as relações entre os personagens. Se na obra de 2014 isso se dava na dinâmica interna do grupo, desta vez James Gunn preferiu separar os integrantes do quinteto em duplas com forasteiros, o que se revela uma solução muito acertada, até para evitar aquela sensação de “mais do mesmo”.

Ao lado de Ego, Peter Quill pode trabalhar seus anseios e sua história pré-abdução. A chegada do homem que preenche as lacunas que o atormentaram durante a infância também coloca em xeque seu posicionamento perante os próprios Guardiões da Galáxia, a família com a qual ele havia escolhido viver.

Já Gamora (Zoe Saldana) tem a oportunidade de acertar suas contas com Nebulosa (Karen Gillan), a irmã de criação com quem desenvolveu uma rivalidade imposta por Thanos. Todo o ódio imbuído na relação entre elas, afinal, pode esconder um sentimento ainda mais profundo.

Drax (Dave Bautista), por sua vez, ganha camadas a mais em suas cenas com Mantis. Graças aos poderes empáticos da moça – capaz de “ler” e transmitir sentimentos – ela pode expor os lados bem-humorado e sensível do brutamonte, cuja postura casca-grossa não o deixaria transparecer de outra forma.

Mas se tem uma dupla que se destaca sobre as demais, essa seria a formada por Rocket Raccoon (Sean Gunn e Bradley Cooper) e Yondu (Michael Rooker), pai de criação de Peter Quill. Sarcásticos e pouco apegados aos ditames legais, eles possuem (juntos e individualmente) alguns dos momentos mais tocantes do filme. Com um único diálogo, ambos são resolvidos enquanto personagens e percebem que têm mais em comum que aparentam.

Ainda que faça parte do mesmo núcleo dos dois últimos, Baby Groot (Vin Diesel) tem sua jornada à parte. Carismático e inocente – embora agressivo –, são dele os pontos mais fofos e engraçados dos 138 minutos de projeção.

As interações entre os personagens se beneficiam, sobretudo, pela química entre os atores. Cada um deles demonstra estar bem à vontade em seus papéis, o que vale até para Kurt Russell (que aparenta ter se divertido bastante interpretando uma divindade) e para Sylvester Stallone, que não faz mais do que uma ponta para lá de especial.

Todos os guardiões têm a oportunidade de explorar suas histórias, dramas e ambições, e a dinâmica de família desfuncional continua dando certo. Uma pena, porém, que diversos momentos-chave sejam atrapalhados pela intromissão excessiva de piadinhas que pouco acrescentam. Este, aliás, já é um problema recorrente dos filmes da Marvel, que parece não permitir que suas tramas possam se levar a sério sequer por duas ou três cenas que sejam – Doutor Estranho e sua capa enxugadora de lágrimas que o digam.

Porém, é claro que não é só de desenvolvimento de personagens que vive um filme de super-heróis, e o Volume 2 não cumpriria seu papel se não investisse de forma competente na ação. O que se vê aqui não é muito diferente do que está no primeiro Guardiões da Galáxia. Atrelada à cartilha Disney, tal qual se percebia no filme de 2014, na sequência não há um real senso de perigo nas aventuras, o que acontece sobretudo porque os próprios personagens não levam o risco a sério.

Não há gravidade nas ações nem violência de verdade. Ainda que cercados por centenas de naves inimigas, para os heróis não há tempo ruim para piadas ou trocas de insultos. A diferença é que desta vez as batalhas – principalmente as espaciais – se amparam fortemente nas referências oitentistas, com claras referências aos arcades daquela época. Tudo é muito bem apoiado pelos excelentes efeitos visuais, que em alguns momentos brincam com o cartunesco, dando um ar mais “infantilizado” à produção.

E falando em visual, a galáxia dos Guardiões permanece vistosa, mas já não garante o mesmo deslumbramento de quando foi vista pela primeira vez. Sem Luganenhum, a locação que serve para encher os olhos dos espectadores nesta sequência é o próprio Planeta Vivo, vislumbrante com sua paisagem paradisíaca e surpreendente em sua referência aos quadrinhos. Também espere ver os alienígenas coloridos habituais, inclusive os Soberanos, uma raça completamente dourada que representa o ótimo trabalho de maquiagem por parte da equipe de produção.

Lamentavelmente, a função da música neste segundo filme não encontra um paralelo com o êxito obtido pelo anterior. Enquanto o “volume 1” viu seu prestígio decolar ao apostar em canções clássicas que, inseridas de forma orgânica na estrutura do filme, ajudavam a contar a história e a criar momentos de humor, o que se vê aqui é uma tentativa falha e artificial de recriar o mesmo efeito. Entenda: não é que a seleção musical seja ruim; ela apenas não flui ou acrescenta à produção como deveria. Há inserções demais e em momentos em que entram como pura forçação de barra. (Quando foi que Rocket Raccoon se tornou tão fascinado pelo estilo musical de Peter?)

No geral, Guardiões da Galáxia Volume 2 se mostra um filme extremamente competente em suas atribuições, mesmo não impactando tanto quanto o predecessor. A franquia continua divertida, envolvente, bem estruturada e ancorada em um rico universo, embora falhe ao pesar a mão no humor e ao forçar nas inserções musicais.

Vai agradar em cheio aos habituados ao Universo Cinematográfico da Marvel e também aos fãs dos quadrinhos das antigas — que vão se esbaldar com a penca de easter eggs, principalmente em suas cinco cenas durante/pós-créditos. Apostando no que agora prova-se seguro, o último trabalho de James Gunn desponta como mais um grande acerto, entrando para o rol de melhores do estúdio, mas que, sem dúvidas, se beneficiaria caso se levasse um pouquinho mais a sério.