FICA 2016

Sertão Serrado: estreia levanta questão da destruição do Cerrado

Às 21h30 de quinta-feira (18), o FICA recebeu o seu primeiro lançamento nacional desta 18ª…

Às 21h30 de quinta-feira (18), o FICA recebeu o seu primeiro lançamento nacional desta 18ª edição: o documentário de meia hora Sertão Serrado, dirigido por Dagmar Talga. O filme integra a Campanha Nacional em Defesa do Cerrado e traz meia hora de tensão com imagens fortes e dados assustadores sobre as atuais condições do Cerrado no Brasil.

Para isso, o filme conta com depoimentos de personalidades especializadas em duas partes: cientistas altamente gabaritados e pessoas comuns de comunidades tradicionais que estão sofrendo com o desmatamento e a ganância do agronegócio.

Entre as cenas mais fortes, estão a de índios guarani-kaiowá feridos a bala, incluindo uma criança, após serem atacados por tratores e dezenas de caminhonetes carregadas de pistoleiros no Mato Grosso. “Eu conhecia os dados, mas nunca os tinha visto em imagens”, contou o ator Eduardo Tornaghi do Movimento Humanos Direitos de combate à escravidão e que empresta sua voz à narração do filme, “fiquei bastante abalado”.

É assim que a produção é montada: os dados, ao invés de ficarem jogados, são associados à imagens fortes e a depoimentos de especialistas. A cena forte do massacra dos guaranis vem logo depois da informação de que as mortes no campo estão crescendo a níveis alarmantes: é um assassinato a cada 15 minutos. Didático, Sertão Serrado pode não ser um primor em forma e experimentalismo, mas cumpre muito bem o seu papel de explicar o seu ponto por a+b de uma forma que é impossível não entender.

O lançamento de Sertão Serrado também marca o lançamento da campanha da Comissão Pastoral da Terra (CPT) Sem Cerrado, Sem Água, Sem Vida. “Esse projeto começou no início de 2015 a partir da necessidade de falar sobre a destruição do Cerrado que já acontece há muitos anos. O filme é mais uma maneira de levar a informação para as pessoas porque os meios de comunicação não informam, realmente, o que está acontecendo, eles ajudam a maquiar todo esse processo”, contou Dagmar.

Durante o vídeo, é revelado que cada cidadão de Goiás consumiu mais de 14 litros de agrotóxico em 2015. No Brasil, a média é de 5 litros por habitante. Em um único copo d’água, podem ser encontrados resíduos de 26 materiais tóxicos, incluindo metais pesados e solventes. Do Cerrado original, restam apenas 5% da fauna e 10% da flora.

Mas o mais doloroso é marcante são as pessoas: reduzidos à quase extinção, o filme expõe a luta diária de quilombolas, retireitos, ribeirinhos, lavradores e, especialmente, a de tribos indígenas, cada vez mais sitiadas pelo agronegócio.

Além disso, este é o ano que marca os 40 anos da CPT e Dagmar conta que possui vários planos no audiovisual sobre as questões da terra no Brasil, em especial em Goiás e no Cerrado: “Temos muitos projetos pela frente, dois deles muito grandes, um deles a gente já trabalha nele há três anos, que é sobre a luta pela terra no Brasil e um pouco sobre a vida e o trabalho do Dom Tomás Balduíno. Este acho que até o final do ano conseguimos finalizar. O outro está em processo inicial que é uma biografia sobre o Leonardo Boff”.

Tornaghi contou que recebeu o convite para a narração por email e que aceitou prontamente: “A Dagmar precisava de alguém para narrar e essa é a minha praia”, disse o ator, bastanta engajado em movimentos sociais. Ele também revelou que até aquele momento não tinha visto nenhum corte do filme: ia vê-lo pela primeira vez na estreia junto com todo mundo. “Ela me mandou o texto, gravei lá no Rio e tá tudo no segredo, tudo na expectativa”.

“O ser humano habita esta terra. Se a gente quer viver bem nela a gente tem que cuidar dela”, disse o ator. Ele acredita que o engajamento da classe artística em movimentos sociais é de fundamental importância e cita como exemplo o engajamento da atriz Letícia Sabatella. Ele contou que sobre como a participação de celebridades no Movimento Humanos Direitos ajudou a chamar a atenção: “Hoje o tráfico de pessoas é um assunto discutido, foi parar na televisão. Uma partizinha responsável por isso foi o trabalho de atores e artistas para dar visibilidade a esta causa”.

Ele conta: “Ajuda em julgamento de pistoleiro, ajuda a defender ameaçados de morte, ajuda a cortar a influência dos poderosos locais. O cara está invisível lá até que chega Letícia, chega Camila Pitanga e com elas vem a imprensa junto, ficam três dias, e a gente consegue mostrar muita coisa. Não resolve tudo, mas é o início de uma solução”.

Agora, o filme irá circular. A próxima parada é Brasília, mas a intenção é fazê-lo rodar por diversos festivais no país e no estrangeiro, buscando aumentar a pressão contra os crimes no campo brasileiro e a defesa das populações tradicionais do Cerrado, suas nascentes, sua fauna e flora.