Crítica

Stranger Things: a melhor estreia do ano

Todo ano, uma nova série ganha o título de “surpresa”: é algum programa que ninguém…

Todo ano, uma nova série ganha o título de “surpresa”: é algum programa que ninguém eperava ou senão não dava importância até ela conquistar corações e mentes ao obrigar o público a ficar colado na tela e depois espalhar a boa palavra para os seus amigos.

No ano passado, a grande surpresa foi a série de paranoia e hackers Mr. Robot. Em 2016, o título vai, sem dúvidas, para Stranger Things. O novo seriado da Netflix é, de longe, a melhor estreia do ano até agora. Com uma primeira temporada de apenas oito episódios, é muito fácil simplesmente se sentar no sofá e só sair dele com a série encerrada.

E são vários os fatores que contribuiem para este sucesso. Stranger Things é uma Criatura de Frankenstein feita com apenas as partes boas de outras séries e filmes. A trama mistura a paranoia e conspiração de LOST e Arquivo X com o bom humor e a aventura de Os Goonies e Super 8.

O fator nostalgia também pesa forte. Situada em 1983, a quantiade de referências, especialmente à O Império Contra-Ataca, Dungeons & Dragons e O Senhor dos Anéis, é enorme. Esta pegada também contribui para um resgate dos filmes de aventura da época que permanecem como clássicos até hoje.

Mas isto é falar apenas por cima. A quantidade de coisas referenciadas na série é impressionante, de Lovrecraft ao Slender Man. Agora que já captei o seu interesse, vamos falar sobre o que ela é.

A trama gira em torno de um grupo de quatro amigos na pacata cidade de Hawkins, Indiana, EUA. A cidade é tão parada que o último desaparecimento ocorreu em 1927. Suicício? 1962. Homocídio? Não há registro. Tudo isso é posto em questão quando o jovem Will simplesmente desaparece sem deixar rastros da noite para o dia.

Além disso, os amigos de Will encontram uma estranha garota de cabeça raspada chamada Onze perdida no meio da floresta. Qual é o seu segredo?

A partir do sumiço de Will, a série se aprofunda não apenas em teorias conspiratórias como não tem medo de brincar e explorar abertamente o sobrenatural. Enquanto outras séries – como LOST e Arquivo X – ficam anos no chove não molha, Stranger Things expõe descaradamente coisas que não deveriam existir e como seus personagens lidam com elas (ou ficam loucos).

Na mesma medida, a série consegue equilibrar com maestria elementos de terror e ficção-científica com muito humor e aventura. A história nunca fica travada e os personagens nunca entram em negação. Se algo muito estranho parece estar acontecendo no meio do mato, nós vamos lá ver isso. E se vier pra cima da gente, vamos lhe dar um tiro na cara.

O engraçado dessa atitude é que a série rompe clichês de gênero que ela anteriormente constrói com muito esmero: veja como esse cara popular é babaca, veja como essa virgem ingênua vai ser passada para trás, veja como esta garota é a donzela em perigo. Tudo isso é construído e então desfeito.

O elenco também é incrível. A série fez sua propaganda em cima de Winona Ryder por este ser realmente o primeiro trabalho dela de grande destaque em mais de uma década. Mas ela é só uma no meio de muitos.

Ryder se sai muito bem, mas é difícil não se envolver com todo o resto do elenco, especialmente com as crianças principais. Este é um elenco mirim não apenas muito talentoso, mas muito bem preparado, que consegue ofuscar com facilidade os adultos e faz o expectador se lembrar, com clareza, dos seus amigos de infância e aventuras.

Mas não é só isso. A série também tira muito proveito do seu contexto de anos 1980, trazendo uma trilha sonora incrível, imagens chuviscadas e batidas eletrônicas que brincam com convenções e gêneros narrativos da época.

A série também mostra um amadurecimento muito grande, quase imensurável, de seus criadores, os Irmãos Duffer. Os Duffer são responsáveis pela decente, mas falha e profundamente esquecível Wayward Pines.

Em pouco mais de um ano, eles foram capazes de criar a própria série original aparando todas as arestas e corrigindo todos os erros cometidos em Pines. Bebendo com sede da fonte de Steven Spielberg, Stephen King e John Carpenter, Stranger Things é uma homenagem aos anos 1980 com gosto de algo novo.

Para não falar que a série é perfeita, há um ou outro problema. Conforme a temporada se encaminha para o final, a série passa a ter problemas para amarrar as suas pontas e acaba deixando alguns furos significativos no roteiro.

Isso é um pouco ruim, pois você vai se pegar dizendo “mas e isso?”, “e aquilo?”. A primeira temporada tem bastante uma pegada de antologia, mas deixa dois pequenos cliffhangers no final, o que pode significar que vamos retornar sim para Hawkins na segunda temporada (já confirmada pela Netflix).

 

Não deixe de assistir! Eu não gosto de dar notas, mas preciso dizer que esta temporada é, fácil, 10 de 10 e vale cada segundo.