Eleições 2020

Candidatos recebem auxílio emergencial e doam para a própria campanha

Pelo menos uma dezena de candidatos a vereador de São Paulo e Rio de Janeiro…

Caixa libera 5ª parcela da ajuda de R$ 600 para novo grupo do Bolsa Família
Começa nesta quinta-feira (20) o saque da 5ª parcela do auxílio emergencial de R$ 600 aos beneficiários do Bolsa Família que têm o NIS (Número de Identificação Social) terminado em 3.

Pelo menos uma dezena de candidatos a vereador de São Paulo e Rio de Janeiro doaram dinheiro para suas próprias campanhas eleitorais enquanto também receberam o auxílio emergencial pago pelo governo federal a prejudicados pela pandemia do novo coronavírus.

O número foi constatado ao cruzar dados já disponíveis de prestação de contas eleitorais com as folhas de pagamento do benefício social.

O levantamento revelou que a candidata a vereadora em São Paulo Mayara Tavares (Patriota) doou R$ 5.150 a sua campanha, divididos em duas transferências eletrônicas realizadas no final do mês de setembro. Dias antes, recebeu R$ 600 do governo federal.

Mayara Tavares, candidata a vereadora pelo Patriota que doou para sua própria campanha e recebeu auxílio emergencial (Imagem: Divulgação)

Desde maio, Mayara já recebeu quatro parcelas do auxílio emergencial, totalizando R$ 2.400. Uma quinta parcela no mesmo valor está com pagamento aprovado.

A candidata declarou à Justiça Eleitoral ter mais de R$ 200 mil depositados em contas bancárias em seu nome. Procurada, Mayara disse que os recursos para doação a sua campanha vieram dessas contas. “Eu fiz uma economia para realizar meu sonho de ser candidata”, disse. “Sou contra o fundão [Fundo Especial de Financiamento de Campanha].”

“Sou autônoma e minha renda diminuiu muito na pandemia”, complementou Mayara, ratificando que precisa do dinheiro.

Com o auxílio, pude manter meu sonho de concorrer a vereadora para ajudar os mais necessitados sem afetar muito a minha subsistência. Não cometi nenhum crime.
Mayara Tavares, candidata a vereadora em São Paulo pelo Patriota

De fato, não há ilegalidade no fato de um candidato ser doador de sua própria campanha e ao mesmo tempo beneficiário de programa social, segundo advogados consultados pelo UOL.

O auxílio emergencial é destinado a trabalhadores sem carteira assinada e desempregados. Para ter direito ao benefício, é necessário possuir rendimentos de até R$ 28.559,70 em 2018 e 2019, ter no máximo de R$ 300 mil em bens e ter renda familiar de até R$ 3.135.

Candidato dono de BMW recebe auxílio

O empresário e candidato a vereador em São Paulo Luiz Castro (PSD) também é beneficiário do auxílio emergencial. Ele fez uma doação de R$ 1.000 para a própria campanha neste mês. Em sua declaração de bens, Castro informou ser dono de um carro BMW X1 avaliado em R$ 70 mil.

Procurado pelo UOL, disse ue recebeu R$ 1.200 do governo federal. Afirmou que, quando solicitou o benefício, precisava do dinheiro. “Foi realmente uma fase de necessidade.”

Mais tarde, acabou recebendo recursos provenientes de seu trabalho, deixou de precisar do auxílio e resolveu investir em sua campanha. “Recebi recursos e decidi investir em santinhos.”

De acordo com o governo federal, entretanto, Castro já recebeu R$ 3.000 em auxílios e continua como beneficiário do auxílio emergencial. Castro recebeu R$ 600 no final de setembro e já tem dois pagamentos de R$ 300 aprovados.

Questionado sobre esses pagamentos, Castro diz que os depósitos feitos em sua conta têm sido estornados.

Estudante candidato ‘sobrevive’ do auxílio

Igor Galvão (PCB) diz que se mantém com auxílio e gastou poupança que já não existe mais (Imagem: Reprodução/Instagram)

O estudante e candidato a vereador em São Paulo Igor da Juventude Trabalhadora (PCB) doou R$ 2.000 para sua campanha no dia 24 de setembro. Um dia antes, recebeu R$ 600 do auxílio emergencial. Ao todo, já foram R$ 3.000 vindos do governo federal.

Igor contou ao UOL que “sobreviveu” na pandemia com ajuda do auxílio. “Faço graduação e estou há dois anos sem um emprego fixo. Até estágio perdi”, afirmou.

O auxílio pagou minhas necessidades básicas durante a pandemia.
Igor da Juventude Trabalhadora (PCB), candidato a vereador e beneficiário do auxílio emergencial

Segundo ele, o dinheiro que ele aplicou em sua campanha veio da poupança acumulada no seu último emprego. “Declarei a poupança à Justiça Eleitoral. Eram R$ 12 mil. Agora, já não tenho mais isso.”

A campanha de Igor já arrecadou mais de R$ 76 mil em doações, segundo prestação de contas preliminares. Disso, R$ 70 mil vieram do PCB.

Doação própria é “vaquinha familiar”

O candidato a vereador no Rio de Janeiro Elzo Araújo (PROS) também é beneficiário do auxílio emergencial e doador de sua própria campanha. Na sua prestação de contas, constam dois depósitos feitos pelo próprio candidato, totalizando R$ 950.

O candidato a vereador no Rio de Janeiro Elzo Araújo (PROS) disse que recebeu “vaquinha” da família (Imagem: Reprodução/Facebook)

Araújo, também conhecido como Gero, disse que precisou do auxílio porque o faturamento de sua microempresa caiu muito na pandemia. Ao todo, ele já recebeu R$ 3.000 do governo. Explicou que só doou para sua campanha pois recebeu ajuda de familiares.

“Pessoal da minha família deu um ajuda. Eu fui lá e depositei”, contou. “Minha mãe tem mais de 70 anos. Se ela tivesse que fazer a doação, não conseguiria nunca.”

O UOL também tentou contato com os candidatos Augusto Nunes (PSD), candidato a vereador em São Paulo. Ele é beneficiários do auxílio emergencial e doador da sua campanha. O PSD, partido de Nunes, informou que o candidato entraria em contato com a reportagem. Até agora, ele não se pronunciou.

O PTB, de Vlad do Foto, se enquadra no mesmo caso. Patrick Welber, vice-presidente do PTB-RJ, disse que procuraria o candidato para que ele prestasse esclarecimentos ao UOL. Vlad não se pronunciou.

Ontem, o TCU (Tribunal de Contas da União) determinou que o Ministério da Cidadania e o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) revisem os pagamentos do auxílio emergencial, Bolsa Família e BPC (Benefício de Prestação Continuada) a candidatos que declararam patrimônio acima de R$ 300 mil. Para o órgão, há indícios de irregularidades na concessão dos benefícios.

Pesquisa do próprio tribunal apontou que 10.724 candidatos que declararam ter mais de R$ 300 mil em bens receberam o auxílio emergencial. Desses, 1.320 têm mais de R$ 1 milhão de patrimônio declarado à Justiça Eleitoral.