Cientistas políticos analisam o “além” da busca por culpado na CPI da Covid
Das motivações políticas, desgaste de Bolsonaro e 2022, saiba o que eles pensam
Uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) busca investigar ações e omissões e, no caso da CPI da Covid-19, no Senado, que tem ouvido ex-secretários (e o titular) da Saúde esta semana, não é diferente. Contudo, esta ferramenta vai além da busca por culpados. Sobre isso, quatro cientistas políticos deram suas visões ao Mais Goiás.
Mestre e doutorando em comunicação, o professor Marcos Marinho afirma que a atividade fim de toda CPI é sempre política. “O inquérito é de investigação política. Levantar equívocos de gestão, problemas, para que, então, após a conclusão abra um desdobramento jurídico, que vai para outra alçada.”
Desta forma, ele avalia que, existindo figuras com clareza de objetivo, estes são alcançados: “O desgaste de oponentes, a elevação da imagem perante o eleitorado [de quem indaga]. Cada fala dentro da Comissão ganha reverberação e funciona como legitimador ou deteriorador da imagem de alguém”, explica.
Ainda segundo ele, o resultado pode render material para fortalecer as bases, discursos, que, neste caso da CPI da Covid-19, servirá como teste de retórica para o ano que vem. “Muitas as atuações geram mais ganhos do que o resultado prático e efetivo de uma futura condenação dos investigados”, aborda.
Outras visões
Para a pesquisadora política Denise Paiva, o intuito da CPI é, de fato, investigar as ações do governo durante a pandemia. Contudo, por se tratar de um instrumento da oposição para investigar o governo, é certamente político-partidária. “Mas é do jogo, não é algo ruim em si.”
Desta forma, ela expõe que, nessas comissões, sempre existe o cálculo político, o que é legítimo. “Nenhum governo gosta de CPI, seja de direita, centro ou esquerda. Coloca holofote sobre as ações e omissões.” Questionada de possíveis desgastes para as eleições de 2022, ela diz que ainda é cedo para dizer. “Vai depender dos resultados, do relatório”, não arrisca.
Já o cientista político Itami Campos vai nas causas da CPI, primeiramente. “Muitos equívocos ocorreram, problemas gerados institucionalmente por parte do governo federal (responsabilidade principal, questão das vacinas e cuidados médicos). Então, a CPI é uma tentativa de responsabilizar algumas pessoas para esse quadro que se vive. Foi motivada pela forma como o governo federal sempre encarou a pandemia.”
Além da questão da investigação, ele também vê a questão política. “A expectativa, inclusive, é que se haja efeito político”, avalia sobre o resultado e impacto de 2022. “O mundo inteiro já se refere ao Brasil de forma contundente na forma como tem sido conduzida a questão da Covid. E o presidente Bolsonaro simplesmente não dá bola para nada disso. Continua fazendo insinuações contra a China, um dos principais compradores do Brasil. É algo que não faz sentido.”
Motivações contraditórias
Especialista em políticas públicas, o professor doutor Luiz Signates vê muitas motivações contraditórias na CPI. “Uma delas, sem dúvida, é a vontade (a meu ver, justa) da oposição em comprometer Bolsonaro com a tragédia da pandemia e da morte de meio milhão de pessoas, até agora. Nunca houve nada igual na história do Brasil e não é correto não responsabilizar o Bolsonaro por boa parte disso.”
Além disso, ele aponta outras motivações, menos nobres. “Uma delas é constituir o fórum de desgaste do governo dele até as eleições do ano que vem, já que a perspectiva do impeachment se mostra cada vez mais improvável, apesar de tudo o que tem acontecido. Outra seria apontar caminhos, mas isso acho pouco significativo, porque é um fenômeno de saúde pública, e não um problema apenas político.”
Assim, na visão dele, as saídas já são “bastante conhecidas”, em face da experiência do mundo inteiro. “Então, a CPI é e creio que será cada vez mais o espaço da disputa política visando 2022”, arremata.
CPI
Instalada na última semana, a CPI da Covid (também chamada de CPI da Pandemia) passou as oitivas de testemunhas nesta semana. A comissão já ouviu os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, e o atual titular, Marcelo Queiroga.
O ex-ministro Eduardo Pazuello já era para ter sido ouvido. Contudo, ele alegou contato com servidores com Covid, e a CPI adiou o depoimento dele.
Na formação, o senador Osmar Azis é o presidente; Randolfe Rodrigues o vice; e Renan Calheiros o relator.