MISSÃO

Ciro Nogueira pede a Bolsonaro autonomia na Casa Civil para lidar com Senado

O presidente do PP e líder do centrão, senador Ciro Nogueira (PI), pediu ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido)…

'Igual cruzar porco espinho com capivara', diz Ciro Nogueira sobre aliança de Lula com Alckmin
'Igual cruzar porco espinho com capivara', diz Ciro Nogueira sobre aliança de Lula com Alckmin - (Foto: Agência Senado)

O presidente do PP e líder do centrão, senador Ciro Nogueira (PI), pediu ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) autonomia nas articulações políticas com o Congresso, em especial o Senado, como condição para chefiar a poderosa pasta da Casa Civil.

Na manhã desta terça-feira (27), o senador se reuniu com Bolsonaro no Palácio do Planalto por cerca de duas horas. Em seguida, anunciou ter aceitado o convite. A nomeação ainda precisa ser publicada no Diário Oficial da União.

Segundo aliados de Ciro Nogueira e do mandatário, Bolsonaro concordou com a demanda e afirmou que o novo ministro terá liberdade para trabalhar.

Uma das preocupações era que o presidente buscasse controlar Ciro e não lhe desse independência à frente da pasta. O temor se justifica porque o presidente já desmentiu ou divergiu de ministros publicamente mais de uma vez.

No ano passado, depois de o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello afirmar que o governo havia assinado carta de intenção de compra da vacina Coronavac, o presidente o desautorizou e recuou no acordo com o Instituto Butantan, ligado ao governo do rival João Doria (PSDB) em São Paulo.

Além disso, o ex-chefe da Justiça Sergio Moro reclamava de falta de autonomia. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já teve negociações com congressistas por aprovação de projetos barradas por ordem do presidente.

Daí a preocupação de Ciro de poder assumir compromissos pela liberação de emendas, cargos e articulações no Congresso que garantam a aprovação de projetos de interesse do Executivo sem ser desautorizado posteriormente.

O ministro assumirá a Casa Civil com a principal função de melhorar a articulação com o Legislativo, em particular com o Senado. A Casa se tornou um problema para o governo e é onde há uma série de projetos parados.

É no Senado que está a CPI da Covid, que tem provocado abalos na popularidade de Bolsonaro ao levantar suspeitas de corrupção e irregularidades em contratos para a compra de vacinas.

Como mostrou a Folha, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), tem privilegiado colocar em votação projetos de autoria de colegas e propostas polêmicas, que já passaram pela Câmara, estão paradas.

Tramitam em regime lento, sob duro escrutínio, projetos como o do licenciamento ambiental, que afrouxa a lei de improbidade administrativa, e o da educação como serviço essencial, proibindo paralisação em pandemia.

Ciro Nogueira entra com a missão de desbloquear pautas. Ainda nesta terça, o futuro ministro disparou ligação a dirigentes e líderes partidários para pedir apoio e afirmar que precisará de suporte.

Além disso, o futuro ministro terá outro objetivo, não menos importante: tentar ampliar o arco de alianças para a reeleição de Bolsonaro em 2022. Para isso, o líder do PP quer focar na reformulação do Bolsa Família e em projetos que impulsionem a economia e possam alavancar a popularidade do presidente.

A aproximação do chefe do Executivo com o centrão ocorre em um momento de extrema fragilidade, quando Bolsonaro se vê ameaçado por mais de cem pedidos de impeachment na Câmara e pelo avanço da CPI no Senado.

Hoje, pesquisas indicam aumento na reprovação do governo e favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o pleito do próximo ano.

Por aceitar chefiar o ministério, o senador deverá abrir mão do plano de disputar o Governo do Piauí. Além disso, ele irá se licenciar da presidência do PP, e o deputado André Fufuca (MA) assumirá interinamente a legenda.

O movimento de Bolsonaro de convidar Ciro para o Planalto consolida a influência do centrão na cúpula do governo, após muitas críticas. O senador comanda um exército de congressistas que dá base de sustentação ao governo. No PP, são 7 senadores e 41 deputados federais.

Comandado na Câmara pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), o centrão reúne siglas de grande, médio e pequeno porte, como PP, PL, PTB e Republicanos, que hoje somam cerca de 150 deputados.

O anúncio sobre o aceite de Ciro foi feito pelo próprio congressista em uma rede social.

“Acabo de aceitar o honroso convite para assumir a chefia da Casa Civil, feito pelo presidente Jair Bolsonaro”, escreveu Ciro. “Peço a proteção de Deus para cumprir esse desafio da melhor forma que eu puder, com empenho e dedicação em busca do equilíbrio e dos avanços de que nosso país necessita.”​

Além da articulação política, a Casa Civil funciona como uma espécie de coordenadora da Esplanada. E a chegada de Ciro ao Planalto não deve ser a única mudança no primeiro escalão.​

Luiz Eduardo Ramos deixará a Casa Civil e vai para a Secretaria-Geral da Presidência, ocupada hoje por Onyx Lorenzoni, que, por sua vez será o titular do Ministério do Emprego e Previdência, a ser recriado com o desmembramento do Ministério da Economia.

Após o encontro no Planalto, Ciro compartilhou uma foto em que, além de Bolsonaro, também aparecem Lira, e os ministros Ramos, Fábio Faria (Comunicações) e Flávia Arruda (Secretaria de Governo).

Ramos confirmou a transferência para a Secretaria-Geral. “Seja bem-vindo Ciro Nogueira ao time Jair Bolsonaro. Desejo muito sucesso na Casa Civil”, escreveu em rede social. “Tenham certeza de que mais uma vez darei o meu melhor em defesa do Brasil.”

Em evento no Planalto, Bolsonaro não citou o nome de Ciro Nogueira, mas disse que o governo teve de se moldar.

“Compusemos um time de ministros nunca visto em outros governos. Abandonamos um pouco a questão política, mas vimos que era necessário cada vez mais buscarmos o apoio e o entendimento do Parlamento brasileiro. Fomos nos moldando”, afirmou o presidente.

Em seguida, em entrevista à Rede Nordeste de Rádio, o presidente disse que a turbina do avião que traria Ciro ao Brasil, antes de assumir o ministério —o senador estava de férias no México—, explodiu em voo. Para Bolsonaro, isso foi um “sinal de Deus”. A assessoria de Ciro havia dito apenas que a aeronave teve problemas no domingo (25), o que adiou a reunião com Bolsonaro na segunda (26) para selar a ida ao ministério.

Bolsonaro ainda disse à rádio que a chefia da Casa Civil é a “alma do governo”. “E realmente nossa interlocução aumentando com o Parlamento brasileiro de forma salutar. Não de forma comprada, como aconteceu no passado”, afirmou.

O presidente minimizou o passado de apoio de Ciro Nogueira a Lula. “No Nordeste era quase impossível fazer campanha sem o PT, reconheço isso. As pessoas mudam. O Ciro está feliz, disse que o sonho da vida dele era ocupar um ministério como este.”

Ciro Nogueira é um exemplo de político acostumado a figurar ao lado do poder, seja ele ocupado pela direita seja pela esquerda. Assim como apoiou e elogiou Lula, já chamou Bolsonaro de fascista.

O senador responde a inquéritos no STF (Supremo Tribunal Federal). São, por exemplo, suspeitas de recebimento de propina e tentativa de atrapalhar a Operação Lava Jato.

O advogado de Ciro, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, afirma que ele foi colocado em foco de investigações quando havia uma “tendência de criminalização da política”.