Orçamento secreto de Bolsonaro e mensalão: oportunidade para 3ª via
Para cientista político, a associação é direta, mas o esquema de Bolsonaro é mais grave
Com o descobrimento de uma conta secreta de R$ 3 bilhões para garantir apoio político a Bolsonaro, imediatamente começaram as comparações ao Mensalão, dos anos 2000. No esquema descoberto em 2005, contudo, teriam ocorridos repasses na casa dos R$ 101 milhões. Apesar das diferenças, o mestre e doutorando em comunicação, o professor e cientista Marcos Marinho vê uma oportunidade para a terceira e o discurso “nem Lula e nem Bolsonaro”.
“A associação é direta [entre essa conta e o mensalão]”, revela o cientista político Marcos Marinho, mestre e doutorando em comunicação. “A questão será a construção da narrativa, mas é fato que essa situação é muito pior que o mensalão do PT”, avalia.
Para Marinho, está escancarado que Bolsonaro organizou uma forma de se manter longe de impeachment. “Emenda é normal, faz parte do processo. Mas a forma como foi destinada não seguiu nenhum trâmite burocrático normal. As pessoas foram ‘pinçadas’. O mensalão do PT era R$ 30 mil. Teve gente neste esquema pegando R$ 200 milhões.”
O professor avalia, ainda, que neste momento, com CPI da Covid, briga constante com a China – que está prejudicando a economia do país –, se os “donos do dinheiro” comprarem a ideia e investirem na alavancagem da narrativa, na exposição ampla em vários canais e com várias abordagens, fazendo paralelismo com o mensalão do PT, “a situação do Bolsonaro fica insustentável”.
“Essa é uma oportunidade para todos os players que tentam emplacar a ideia de ‘nem Lula e nem Bolsonaro’. Dá pra bater nos dois, mas mais no Bolsonaro por conta do contexto, e ganhar o pessoal da direita.”

Orçamento de Bolsonaro
Segundo informações do Estadão, o esquema de orçamento secreto montado por Bolsonaro soma R$ 3 bilhões para serviços de obras e compras de tratores e máquinas agrícolas indicados por um grupo escolhido a dedo de deputados e senadores. Além disso, conforme apurado, no final do ano passado, o governo teria atropelado ao menos três exigências da legislação – Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Ainda segundo o jornal, na edição de domingo, foi descoberto um esquema de compra de apoio parlamentar por meio de um novo tipo de emenda de relator-geral do orçamento, a chamada RP9. Destaca-se, que – do total – R$ 271,8 milhões foram destinados à aquisição de máquinas pesadas por preços até 259% acima dos valores da tabela. O esquema, que foi concentrado em um grupo de parlamentares, foi chamado de “tratoraço”.
Restes recursos são paralelos os previstos nas tradicionais emendas individuais a que todos os congressistas têm direito, aliados ou oposicionistas, aponta a reportagem.
Destaca-se, o mau uso do dinheiro público foi descoberto pela reportagem por meio de 101 ofícios enviados por senadores e deputados ao Ministério do Desenvolvimento Regional e órgãos vinculados. Nos documentos, indicações como preferiam desembolsar os recursos.
Destaca-se, só o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), ex-presidente do Senado, determinou a aplicação de R$ 277 milhões de verbas públicas só do Ministério do Desenvolvimento Regional, assumindo a função do ministro Rogério Marinho. Por vias convencionais, ele levaria 34 anos para receber a verba por emenda – cada parlamentar tem direito a direcionar apenas R$ 8 milhões ao ano.

Mensalão
Para quem não lembra, em 2005 ocorreu a acusação de que deputados vendiam apoio político ao governo do então presidente Lula (PT) – que estava em sua primeira gestão – em troca de mesada. A notícia teve início por causa de uma reportagem da Veja, em 14 de maio, que tratava sobre corrupção nos Correios.
À época, foi divulgado um vídeo em que o então funcionário dos Correios, Maurício Marinho, aparecia recebendo propina e falando de um esquema de desvio de dinheiro. Segundo ele, eram três designados pelo PTB, pelo próprio presidente da sigla, Roberto Jefferson, que era deputado federal.
Jefferson, hoje aliado de Bolsonaro, quando acusado denunciou a Folha de S. Paulo a existência do mensalão, onde deputados do PP e do PL, atual PR, recebiam R$ 30 mil por mês para votar os projetos de interesse do petista.
Vale lembrar, na mesma época Jefferson chegou a dizer que Lula não sabia. Ao conselho de ético da Câmara – já investigado na Casa -, ele disse ter recebido R$ 4 milhões do PT sem declarar à Justiça Eleitoral, mas contado ao então Chefe da Casa Civil, José Dirceu, sobre o mensalão e a participação do tesoureiro da sigla, Delúbio Soares.
“A reação o presidente foi como se tivesse levado uma facada nas costas”, afirmou ao jornal e, ainda: “Zé Dirceu, se você não sair daí rápido, vai fazer réu um homem inocente que é o presidente Lula.” Em 16 de junho o ministro da Casa Civil perdeu o cargo.
Nas semanas seguintes, Jefferson revelou que o mensalão era pago no Banco Rural, com assessores parlamentares encarregados de buscar a propina. O responsável pelo dinheiro, segundo ele, era Marcos Valério, um empresário da área de propaganda, de Minas Gerais.
As contas do publicitário movimentaram mais de R$ 25 milhões entre 2003 e 2004, que ele justificou como empréstimos bancários, que repassava para o PT pagar despesas de campanhas eleitorais. Ele disse que foi avalista de um dos empréstimos do PT no valor de R$ 2,4 milhões, mas negou irregularidades.

Outros três dirigentes do partido foram avalistas: José Genoino, então presidente do PT, o tesoureiro Delúbio Soares, e Sílvio Pereira, secretário-geral. Genoino disse que assinou sem ler, em 3 de julho de 2005.
A justificativa do PT no Congresso é que se tratava de caixa dois, dinheiro não declarado à Justiça Eleitoral – nada de mensalão. “O PT, durante 2003 e 2004, usou recursos não contabilizados para quitar dívidas das nossas campanhas. Todos nós sabemos como é feito uma campanha eleitoral”, argumentou Delúbio, em 20 de julho de 2005. Ele se afastou da direção, junto com Genoíno e Silvio Pereira, naquele mesmo mês.
Em seguida, Duda Mendonça, outro publicitário, admitiu publicamente que recebia pagamentos do PT (dinheiro não declarado) em uma conta bancária fora do Brasil, que teria sido aberta por ordem de Marcos Valério. Então, o ex-ministro da Secretaria de Comunicação. Luiz Gushiken foi acusado de mandar o Banco do Brasil assinar contrato de publicidade, sem licitação, com a empresa DNA, de Marcos Valério, bem como pagar antecipadamente mais de R$ 20 milhões à empresa. Gushiken também deixou o governo.