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Saiba para onde vai o 13º salário dos goianos
Cerca de 33,8 milhões de brasileiros pretendem gastar pelo menos metade do benefício de fim de ano com presentes, festas e itens pessoais adiados ao longo do ano, segundo pesquisa.
A primeira parcela do 13º salário deve entrar na conta na próxima sexta-feira (28), e com ela vem a conhecida sensação de alívio que costuma marcar o fim do ano. Para muitos goianos, é o momento de respirar um pouco depois de meses de aperto. Mas, antes mesmo de cair na conta, esse dinheiro já tem destino e impacto direto na economia e no comportamento das famílias.
Segundo estimativa do Dieese, divulgada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), o pagamento do 13º deve injetar R$ 369,4 bilhões na economia brasileira em 2025. Por aqui, serão cerca de R$ 10,4 bilhões a mais no mercado, o equivalente a 2,6% do PIB estadual, distribuídos entre quase 3 milhões de beneficiários goianos. É um volume capaz de movimentar comércio, serviços e aliviar o caixa das famílias, ainda que, na prática, boa parte desse valor siga rumos menos estratégicos.
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A pesquisa nacional da CNDL/SPC Brasil, feita em parceria com a Offerwise, revela que 33,8 milhões de brasileiros pretendem gastar pelo menos metade do 13º em compras de fim de ano. Presentes (30%), festas e confraternizações (21%) e itens pessoais adiados ao longo do ano (20%) dominam as intenções. Entre os que recebem o benefício, 86% afirmam que esse “valor extra” influencia total ou parcialmente seus gastos.
A economista Adriana Pereira de Sousa, doutora em Políticas Públicas e professora de Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Goiás (UEG), explica que esse impulso não é apenas econômico, mas cultural. Para ela, o fim do ano ativa um “rito social do consumo”, que mistura tradição, pertencimento e a sensação de recomeço.
Adriana lembra que essa decisão acontece mesmo diante de um cenário preocupante: “Os dados da CNDL, da ANBC e de outros indicadores mostram que 79,5% das famílias brasileiras estão endividadas e cerca de 30% estão inadimplentes. Em Goiás, os índices são ainda maiores. Mesmo assim, a cultura do consumo festivo continua forte”, comenta.
Segundo ela, o 13º cria a sensação de “dinheiro novo”, mas essa euforia raramente resiste ao mês de janeiro, quando se concentram despesas obrigatórias como IPVA, IPTU, material escolar e reajustes de mensalidades.
A conta que não fecha
O alerta fica ainda mais evidente quando olhamos com mais atenção para quem deve na praça. De acordo com a Associação Nacional dos Bureaus de Crédito (ANBC), Goiás encerra 2025 com 2,62 milhões de adultos negativados, ou 46,2% da população acima de 18 anos. O valor médio das dívidas subiu 19,6% em um ano, pressionado pelos juros altos.
Diante dessa realidade, a economista Adriana é direta. “Usar grande parte do 13º para consumo, quando o orçamento já está estrangulado, aprofunda vulnerabilidades e fragiliza ainda mais a saúde financeira das famílias”, comenta.
A professora da UEG recomenda que esses valores tenham outro papel, especialmente em contextos com alto endividamento. Ela defende que o benefício seja tratado como amortecedor financeiro, não como incentivo ao consumo. “O ideal é que as famílias usem o 13º para reorganizar o orçamento, reduzir dívidas caras e reconstruir uma margem mínima de segurança. Isso não significa abrir mão do Natal, mas sim mudar a prioridade.”
E complementa que em um contexto de juros elevados, cada real usado para reduzir dívidas gera um ganho maior do que qualquer compra de curto prazo.
Renda extra para presentes
A mesma pesquisa da CNDL/SPC mostra que 56% dos brasileiros pretendem fazer bicos neste fim de ano para aumentar o consumo natalino. Para a economista, isso revela duas coisas: primeiro, que a renda regular deixou de ser suficiente para cobrir necessidades básicas; segundo, que o ato de presentear ainda funciona como símbolo de afeto e pertencimento social.
“A busca por renda extra pode ser positiva, mas, quando usada para sustentar padrões de consumo insustentáveis, ela apenas mascara o problema. Trabalha-se mais, mas não se constrói segurança financeira”, analisa Adriana.
O desafio é equilibrar o impulso de consumo com a necessidade urgente de evitar que o 13º se transforme em preocupação em janeiro. Com a chegada da primeira parcela, a orientação da economista é refletir antes de gastar. “Não tome decisões financeiras sob euforia ou pressão social.”
Ela lembra ainda que dezembro é o mês mais agressivo em publicidade, com apelos emocionais fortes e ofertas constantes. Por isso, recomenda: “Pare, faça um diagnóstico da sua vida financeira e defina um destino para cada real antes de gastá-lo.” Mesmo que não seja possível quitar tudo, dá para renegociar juros, eliminar pendências pequenas para ganhar fôlego e separar uma reserva para janeiro e só depois pensar no consumo das festas.
O que diz a lei
O 13º salário é um direito previsto nas Leis 4.090/1962 e 4.749/1965. O trabalhador recebe um doze avos por mês trabalhado. A primeira parcela, de 50% do valor bruto, deve ser paga até 30 de novembro – este ano, até 28 de novembro por ser o último dia útil do mês; a segunda, com descontos de imposto de renda e previdência, até 20 de dezembro. Quem trabalhou parte do ano recebe proporcional, e quem está em licença-maternidade ou afastado pelo INSS recebe pelo próprio instituto.
Trata-se de uma conquista social importante, que injeta bilhões na economia e dá fôlego às famílias todos os anos. Mas, em um tempo de inadimplência elevada e renda comprimida, usá-la com sabedoria deixou de ser conselho: virou necessidade estratégica.
Consumir traz alegria, mas o equilíbrio financeiro traz liberdade e é essa liberdade que deveria guiar as escolhas deste fim de ano.
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