Consumidor

123milhas suspende passagens: consumidor não é obrigado a aceitar vouchers

É possível ir à Justiça para pedir que empresa arque com despesas já feitas com passeios

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Após anunciar que não emitirá passagens de sua linha promocional, a Promo, para o período entre setembro e dezembro deste ano, a 123milhas ofereceu apenas uma forma de ressarcimento aos clientes: um voucher para ser usado em seu próprio site. A medida, segundo advogados, é arbitrária, já que os clientes têm, por lei, a opção de receber de volta as quantias gastas em dinheiro.

A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), ligada ao Ministério da Justiça, disse que “a cláusula contratual que permita cancelamento de forma unilateral é considerada abusiva e consequentemente nula”. O órgão afirmou ainda que “a opção por voucher não pode ser impositiva, tampouco exclusiva”.

De acordo com especialistas, é possível recorrer à Justiça também para pedir que a 123milhas arque com despesas já quitadas pelos clientes em viagens planejadas, como hotéis e passeios turísticos Veja, abaixo, quais são os seus direitos:

Quais são as passagens que a 123milhas suspendeu?

A 123milhas decidiu suspender a venda e emissão de passagens e pacotes da linha Promo, com previsão de embarque de setembro a dezembro de 2023.

São produtos com com datas flexíveis, ou seja, em que o cliente tem ideia do período em que viajaria, mas não tem certeza do dia exato da viagem, nem da companhia aérea em que vai voar.

Segundo a companhia, os demais produtos da 123milhas não serão afetados.

Passagens já emitidas pela 123milhas serão mantidas?

Sim. Se o cliente já recebeu a passagem, o localizador ou o e-ticket, a viagem está confirmada.

O que a 123milhas oferece para quem teve passagem suspensa?

A 123milhas informou que vai devolver integralmente o valor pago pelos clientes, com adição de correção monetária de 150% do CDI (taxa usada como parâmetro para calcular rentabilidade de investimentos). A companhia, no entanto, vai disponibilizar as quantias em formato de crédito, ou voucher, que pode ser usado para adquirir outros produtos em seu próprio site.

“As medidas referentes à linha Promo são uma decisão responsável da 123milhas, no sentido de preservar os valores pagos pelos clientes. A empresa continua comprometida com o propósito de proporcionar a mais pessoas experiências mais acessíveis em viagens e turismo”, afirmou em nota.

Como fazer a emissão do voucher no site da 123milhas?

O voucher pode ser usado no site da 123milhas em até 36 meses e pode ser emitido por esse link. Para isso:

  • Escolha “É sobre um pedido ou reserva”;
  • Clique em “Promo123”, “Cancelamento”, “Solicitar Voucher”;
  • Preencha com os seus dados e busque a reserva;

Os embarques a partir de janeiro de 2024 pela linha Promo também estão suspensos?

Não. No entanto, a empresa abriu a possibilidade para que os clientes solicitem vouchers se quiserem também para os bilhetes com previsão de embarque a partir de 2024 . Segundo a 123milhas, as condições serão as mesmas oferecidas aos que embarcariam até o fim do ano.

Tenho que aceitar o voucher da 123milhas?

Não. A solução de oferecer apenas um voucher é arbitrária, avaliam os advogados.

Igor Britto, diretor de Relações Institucionais do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) critica a “falta de transparência na comunicação” da empresa, pois ela apresentou apenas uma forma de resolução do problema, contrariando o artigo 35 do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Em sua opinião, a empresa “praticamente obriga” que os clientes recorram à esfera judicial.

— A 123milhas está fazendo isso porque sabe que a grande maioria dos brasileiros evita ir ao judiciário. E quem for vai demorar, no mínimo, de seis meses a um ano para ter uma solução. Eles estão brincando com a ineficiência do sistema brasileiro de justiça — aponta.

É possível pedir o dinheiro de volta para a 123milhas?

De acordo com CDC, quando um vendedor se recusa a cumprir uma oferta, o consumidor tem três opções:

  • Ele pode exigir o cumprimento do acordo forçado, ou seja, exigir que a companhia emita a sua passagem e o pacote vendidos;
  • Pode aceitar um produto equivalente, como o voucher para a troca por outro serviço;
  • Ou o cliente tem a possibilidade de pedir o dinheiro de volta com correção monetária.

Ainda que a empresa use milhas de terceiros para fazer a compra dos bilhetes, segundo a advogada Cátia Vita, especialista em direito do consumidor, continua sendo uma prestadora que está sujeita a respeitar o Código de Defesa do Consumidor.

—Muitas vezes, ao optar pelo voucher, a pessoa não vai conseguir comprar outra passagem pelo mesmo preço. O consumidor acaba ficando prejudicado — alerta.

Por que a 123milhas suspendeu a venda e emissão de passagens?

Segundo a companhia, a decisão se deve a “desafios econômicos, como a alta demanda por voos mesmo em baixa temporada, o que mantém os preços elevados, além do alto patamar dos juros”.

Posso pedir indenização à 123milhas?

Sim. Além de um pedido de indenização por danos materiais, por eventuais gastos extras, o consumidor pode solicitar indenização por tempo perdido e por danos morais. O valor varia de acordo com o entendimento de cada juiz sobre a gravidade da quebra da expectativa, por exemplo se o cliente lesado perdeu algum evento importante ou não tem como tirar férias em outro período, segundo especialistas.

— Em casos com grande planejamento para a viagem e em que o cancelamento possa gerar uma grande frustração e abalo moral, o que foge do mero aborrecimento, é cabível indenização por dano moral. Quanto ao valor da indenização, depende da análise do juiz no caso — analisa Luan Dantas, advogado especialista em direito do consumidor.

Como ficam hospedagens e ingressos para pontos turísticos já comprados?

Segundo a advogada especializada em direito do consumidor Cátia Vita, o primeiro passo é entrar em contato diretamente com o hotel e empresas que forneceram ingressos e trasporte já comprados, explicar a situação e pedir o reembolso a eles.

Caso essas empresas não concordem com o ressarcimento, o consumidor pode acionar a 123milhas. Cátia recomenda guardar documentos que comprovem os gastos, incluindo troca de mensagens, para pedir o reembolso, administrativamente ou judicialmente.

Mas a decisão final caberá ao juiz que eventualmente julgar o caso.

E se o consumidor decidir seguir com a viagem, comprando uma passagem de última hora numa companhia aérea? A 123milhas terá que pagar por essa passagem?

Para o advogado Luan Dantas, em tal hipótese, o consumidor pode entrar com uma ação na Justiça, pedindo o reembolso do valor pago.

Para isso, é necessário comprovar a relação causa-efeito. A determinação pelo pagamento dessa despesa não é uma certeza e depende da avaliação de cada magistrado.

O que diz o governo sobre a decisão da 123milhas de suspender as passagens?

A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) informou que a modalidade de venda de passagens por meio de transferência de milhas precisa atender a previsão do Código de Defesa do Consumidor. Por isso, a cláusula contratual que permite o cancelamento de forma unilateral é considerada abusiva e sem feito.

“O reembolso deve garantir que os consumidores não tenham prejuízo e a opção por voucher não pode ser impositiva, tampouco exclusiva. A devolução deve atender os valores pagos com eventuais correções monetárias. O direito à informação deve essencialmente conduzir este processo , com plano claro de comunicação, fluxo e modalidade de reembolso”, disse a Senacon em nota.

A Senacon diz ainda que, caso se sinta lesado, o consumidor pode fazer registro na plataforma consumidor.gov.br. Também podem registrar queixa nos Procons.

Os ministérios do Turismo e da Justiça informaram que vão investigar o caso.