Bolsonaro questiona transparência do sistema eleitoral brasileiro
"Eu quero que você me ache um brasileiro que confie no sistema eleitoral brasileiro", declarou o presidente nos Estados Unidos
O presidente Jair Bolsonaro colocou mais uma vez em xeque a Justiça Eleitoral nesta terça-feira (10), em mais uma capítulo de sua escalada contra diversas instituições do país.
Um dia depois de afirmar que houve fraude eleitoral em 2018, sem apresentar, porém, nenhuma prova sobre o que estava falando, Bolsonaro afirmou a jornalistas que não há ninguém no país que confie no sistema eleitoral.
“Eu quero que você me ache um brasileiro que confie no sistema eleitoral brasileiro”, declarou o presidente após participar de um esvaziado evento com empresários em Miami.
Questionado por uma repórter se não confia na Justiça Eleitoral, Bolsonaro respondeu exaltado: “Não é na Justiça, não deturpe as minhas palavras. Não façam essa baixaria que a imprensa sempre faz comigo.”
Essa foi a primeira vez, durante sua viagem de quatro dias aos EUA, que o presidente falou com a imprensa. As declarações duraram menos de dois minutos e ocorrem antes de ele embarcar para Jacksonville, onde fará uma visita de duas horas à fábrica da Embraer e, depois, segue para Brasília.
Nesta segunda-feira (9), durante encontro com a comunidade brasileira em Miami, o presidente já havia lançado suspeitas sobre a Justiça Eleitoral, mas acrescentou que tinha provas para mostrar que houve fraude em 2018, quando, segundo ele, teria vencido ainda no primeiro turno.
Apesar de repetir que tem indícios sobre o que está falando, o presidente não apresentou nenhum material, mesmo após ser questionado pelos jornalistas.
O presidente tem escalado seus embates e minado uma a uma suas relações com Congresso, imprensa e, desta vez, com a Justiça Eleitoral.
Em outubro de 2018, quando era o candidato presidencial do PSL, Bolsonaro fez um pronunciamento na internet no qual disse suspeitar que só não havia vencido Fernando Haddad (PT) no primeiro turno devido a fraudes nas urnas eletrônicas. Mas essa é a primeira vez que fala em provas desde que chegou ao Planalto.
Antes do segundo turno de 2018, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mandou fazer uma auditoria externa que comprovava a segurança do sistema de urna eletrônica no Brasil.
Outro lado
O TSE rebateu a declaração do presidente Bolsonaro de que a eleição de 2018 foi fraudada e reafirmou, em nota divulgada nesta terça (10), que o sistema de urnas eletrônicas é confiável e auditável. “Ante a recente notícia, replicada em diversas mídias e plataformas digitais, quanto a suspeitas sobre a lisura das eleições 2018, em particular o resultado da votação no 1º turno, o Tribunal Superior Eleitoral reafirma a absoluta confiabilidade e segurança do sistema eletrônico de votação e, sobretudo, a sua auditabilidade, a permitir a apuração de eventuais denúncias e suspeitas, sem que jamais tenha sido comprovado um caso de fraude, ao longo de mais de 20 anos de sua utilização”, afirmou o TSE, presidido pela ministra Rosa Weber.
A nota do TSE também afirma que, existindo qualquer elemento de prova que sugira algo irregular, o tribunal agirá com presteza e transparência para investigar o fato.
“Mas cabe reiterar: o sistema brasileiro de votação e apuração é reconhecido internacionalmente por sua eficiência e confiabilidade. Embora possa ser aperfeiçoado sempre, cabe ao tribunal zelar por sua credibilidade, que até hoje não foi abalada por nenhuma impugnação consistente, baseada em evidências”, continua o texto do tribunal.
“Eleições sem fraudes foram uma conquista da democracia no Brasil e o TSE garantirá que continue a ser assim.”
Nesta tarde, após emitir a nota, a ministra Rosa Weber falou com jornalistas ao chegar para a sessão das turmas no STF (Supremo Tribunal Federal). Rosa não costuma se manifestar fora de processos ou notas oficiais, mas abriu uma exceção.
“Que fique muito claro: a Justiça Eleitoral não compactua com fraudes. A nota lançada hoje, em nome do Tribunal Superior Eleitoral, é muito clara. Eu mantenho a minha convicção quanto à absoluta confiabilidade do nosso sistema eletrônico de votação. E essa confiabilidade e essa segurança advêm, em especial, da auditabilidade das urnas eletrônicas. Isso foi um verdadeiro mantra durante as eleições de 2018. Tanto que, ao longo de mais de 20 anos de utilização do sistema, jamais foi comprovada qualquer fraude”, disse Rosa.
Questionada sobre o fato de Bolsonaro não ter apresentado provas das alegadas fraudes, a ministra respondeu: “Aí a atuação é do presidente, não é minha. A minha é essa que eu registrei [na nota]”.
Os ministros do STF Luís Roberto Barroso e Marco Aurélio Mello também comentaram as suspeitas lançadas pelo presidente da República.
“Nós nunca tivemos qualquer evidência objetiva de fraude. O sistema é totalmente confiável, respeitado mundialmente. Agora, se alguém trouxer alguma prova, alguma evidência, estou pronto para examinar, a gente tem sempre espaço para aperfeiçoamento. Agora, não pode ser uma coisa retórica, tem que ser uma coisa fundada em elementos objetivamente aferíveis. Não pode ser ‘eu acho’, é preciso que haja elementos”, disse Barroso.
“O que posso dizer é que capitaneei [como presidente do TSE] as primeiras eleições informatizadas, em 1996, nos municípios com mais de 100 mil eleitores e de lá para cá não houve uma única impugnação ao sistema minimamente séria”, afirmou o ministro Marco Aurélio. “Ninguém coloca em dúvida a lisura da Justiça.”