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Goiano relata arrependimento ao lutar em guerra na Ucrânia: “Gastei R$ 16 mil”

Brasileiro foi recrutado em grupo presente em redes sociais como WhatsApp, Telegram e Instagram

Brasileiro foi recrutado em grupo presente em redes sociais Goiano relata arrependimento ao lutar em guerra na Ucrânia
Foto: Ilustrativa/FreePik

O goiano Marcelo (nome fictício, para preservar sua identidade), de 28 anos, relatou ao site GQ que se arrependeu de participar da guerra na Ucrânia. O brasileiro, natural de Formosa, Goiás, conta que embarcou para o conflito motivado pela promessa de salários atrativos, mas acabou gastando cerca de R$ 16 mil entre passagens, transporte e equipamentos, e hoje reconhece que a aventura não valeu o preço pago. “Me arrependo profundamente. Nenhum dinheiro compensa o que passei”, afirma.

Marcelo descobriu que sua esposa estava grávida do segundo filho apenas um dia antes de embarcar, mas manteve os planos por já ter a passagem comprada. Ele optou por não se identificar completamente para a reportagem, mas detalhou toda a rotina e os desafios enfrentados na linha de frente do conflito. Recrutado por grupos de WhatsApp, Telegram e Instagram, ele foi atraído pela promessa de salários de até 5 mil dólares, pouco mais de R$ 25 mil, como pagamento pelo serviço militar.

Ao chegar à Ucrânia, Marcelo foi direcionado à 92ª Brigada de Assalto e depois transferido para a 4ª Legião Nacional de Treinamento, unidade destinada a soldados estrangeiros. Ele recebeu três refeições diárias, mas precisou comprar equipamentos por conta própria, como coletes e porta-carregadores, para se proteger adequadamente. “Eles forneciam o material básico, mas quem queria proteção de qualidade tinha que gastar do próprio bolso”, relatou.

Marcelo também se deparou com situações que não esperava, como a exigência de pagar as contas de luz e gás do alojamento. “Nunca disseram que isso seria cobrado de nós. Sabíamos que em guerra nada é fácil, mas luz e gás deveriam ser fornecidos”, lembra. Ele passou por semanas de tensão até conseguir negociar a devolução de seu passaporte e conseguir retornar ao Brasil com segurança.

O goiano explica que sua experiência nas Forças Armadas Brasileiras, entre 2016 e 2020, contribuiu para sua decisão de se alistar, acreditando que poderia aplicar seu conhecimento militar e ainda enviar dinheiro para a família. Inicialmente, ele planejava despachar R$ 6 mil para casa, mas a realidade do conflito mostrou-se muito mais arriscada e enganosa do que o prometido.

Marcelo descreve que, no início, assinou um contrato com a 92ª Brigada e, sem aviso prévio, foi transferido para a 4ª Legião, onde teve seus documentos e celulares controlados pelos superiores. A comunicação com a família era restrita, e apenas uma ligação para sua esposa mudou seus planos. Ao descobrir que ela tinha uma gravidez de risco, Marcelo insistiu em retornar, enfrentando resistência dos comandantes e demorando três semanas para conseguir recuperar seu passaporte.

O retorno envolveu riscos adicionais. Marcelo relata ter se sentido em cárcere até conseguir fugir, pegar um táxi e embarcar para o Brasil a partir de Varsóvia, na Polônia, a porta de entrada para brasileiros alistados na Ucrânia. “No meio do caminho, preferi correr o risco sozinho do que confiar neles. Tive medo de morrer várias vezes, especialmente na fronteira”, declarou.

A história do goiano contrasta com outros brasileiros no conflito, como Lucas Felype Vieira Bueno, de 20 anos, que ainda não conseguiu retornar ao Brasil e relata estar “preso” à linha de frente devido ao contrato assinado com o exército ucraniano. Segundo Marcelo, muitos voluntários enfrentam a mesma dificuldade, sem celulares ou passaportes, tentando escapar do conflito.

O recrutamento de brasileiros para a guerra ucraniana tem sido facilitado por páginas traduzidas para o português e grupos de redes sociais administrados por recrutadores, alguns brasileiros. O alistamento é gratuito, mas os candidatos devem custear a passagem aérea de ida. A ida ao conflito é uma decisão individual, e não há lei que impeça cidadãos brasileiros de se alistarem em exércitos estrangeiros.

Em nota, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil reforça que os cidadãos devem recusar ofertas de alistamento voluntário, e a Embaixada da Ucrânia garante que os brasileiros no exército do país entraram por livre e espontânea vontade, com contratos assinados voluntariamente, e têm os mesmos direitos que os militares ucranianos.

Apesar das garantias, o goiano enfatiza o aprendizado que levou para a vida: “Nenhum dinheiro vale o risco que corremos. A guerra não é videogame, é a vida real. Hoje sei o que realmente significa se arrepender de uma decisão.”