SAÚDE

Mesmo proibido no país, cigarro eletrônico é comprado até por delivery

A biomédica Patrícia de Oliveira, 28, lembra-se bem do mês e do ano: outubro de…

Mesmo proibido no país, cigarro eletrônico é comprado até por delivery (Foto: Agência Brasil)
Mesmo proibido no país, cigarro eletrônico é comprado até por delivery (Foto: Agência Brasil)

A biomédica Patrícia de Oliveira, 28, lembra-se bem do mês e do ano: outubro de 2017. Foi quando experimentou pela primeira vez um cigarro com sabor de fruta, em uma balada com os amigos. No início, só fumava nos fins de semana, mas logo o hábito se estendeu também para os outros dias.

À época, foi apresentada aos cigarros eletrônicos por amigos que traziam os dispositivos de Miami (EUA). “Como não deixava cheiro e diziam que ele iria ajudar no vício, eu achei perfeito”, lembra.

Durante a pandemia de Covid-19, porém, ela passou a aliar o cigarro eletrônico ao tabaco enrolado à mão. Há um mês, percebendo a dependência e a falta de fôlego para os exercícios, buscou ajuda médica para parar de fumar, com auxílio de medicação e psicoterapia.

Entre os amigos, porém, uso dos dispositivos têm sido cada vez mais frequente. “Fui com cinco deles a um rodízio japonês no último fim de semana. Na saída, os cinco estavam com cigarros eletrônicos. Eles são encontrados muito facilmente em tabacarias, bancas e entregues até por aplicativos de delivery por R$ 90”, conta.

Pesquisa Datafolha encomendada pela ACT Promoção da Saúde mostra que grande parte dos usuários dos chamados DEFs (dispositivos eletrônicos para fumar) comprou esses produtos em locais como tabacarias, lojas de conveniência, bancas de jornal, supermercados e sites, mesmo a venda sendo proibida no país desde 2009.

O levantamento revela que 3% da população acima de 18 anos faz uso diário ou ocasional desses dispositivos, também chamados de cigarros eletrônicos, e-cigarette, e-ciggy, e-pipe e tabaco aquecido.

O assunto tem preocupado os especialistas de saúde pública e virou tema de uma audiência na última quinta (26), na Câmara dos Deputados. A percepção deles é que está aumentando o uso desses dispositivos entre os jovens e muitos estão iniciando no tabagismo a partir deles.

Essa situação, associada ao fato de que houve alta de 34% no consumo de cigarros no país durante a pandemia, pode desacelerar a queda do número de fumantes no Brasil, segundo os especialistas.

Referência mundial, o programa nacional de combate ao tabagismo conseguiu reduzir o percentual de fumantes no país de 30% para 12,8% da população entre 1986 e 2019. Os dados de 2020 ainda não foram divulgados pelo Ministério da Saúde.

A assessora de imprensa Clarissa Perillo, 37, integra o time dos que viram aumentar o consumo de cigarros durante a pandemia devido à ansiedade. “Antes eu fumava uns 14 cigarros por dia, agora são 20, um maço”, diz ela, que fuma desde a adolescência.

Por duas ocasiões ela tentou cessar o tabagismo, uma delas por quase um ano, mas acabou recaindo. “Eu e meu marido decidimos juntos. Paramos de sair com amigos, de beber, para não ter gatilho.”

Uma transição para os cigarros eletrônicos também não funcionou. “Eu tragava e me dava acesso de tosse, além de mal-estar. O Le [o marido] fumou um tempo o eletrônico, mas voltou para o convencional.”

Segundo médicos, tem sido frequente usuários de dispositivos eletrônicos, que nunca tinham fumado antes, migrarem em algum momento para os cigarros convencionais. “Se por alguma razão eles não têm o eletrônico, partem para o convencional”, diz a cardiologista Jaqueline Scholz, diretora do Programa de Tratamento do Tabagismo do InCor (Instituto do Coração).