“Meu pai já estava imobilizado, não precisava do tiro”, diz filho de pai morto por PMs em UTI
Família exige respostas e promete levar caso à Justiça, buscando responsabilização de envolvidos em morte de paciente que fez enfermeira refém em Morrinhos (GO)

“Meu pai já estava imobilizado, não precisava do tiro”, disse filho de pai morto por Policiais Militares (PMs) em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de hospital de Morrinhos, no sul do estado de Goiás. A família de Luiz Cláudio Dias, de 59 anos, contesta versão da Polícia Militar e denuncia negligência médica e abuso de autoridade policial em ação que resultou na morte do paciente, no dia 18 de janeiro.
Segundo o filho da vítima e cirurgião-dentista, Luiz Henrique Dias, afirma que o pai sofreu um episódio de hipoglicemia que pode ter causado agitação, o que poderia ter sido evitado com atendimento adequado. Família também denuncia que soube da morte por meio de vídeos vazados, antes de ser informada oficialmente.
Hipoglicemia
Em um vídeo enviado ao Mais Goiás, Luiz Henrique Dias compartilhou detalhes sobre os problemas de saúde enfrentados pelo pai, Luiz Cláudio Dias. Segundo ele, o pai enfrentava diversas comorbidades, mas se mantinha ativo apesar das limitações. “Meu pai fazia hemodiálise há 24 anos, era diabético, hipertenso e tinha deficiência visual severa. Mesmo com tantas dificuldades, ele sempre foi muito ativo”, relatou.
Conforme o filho, o pai sofreu um episódio de hipoglicemia, um quadro recorrente em sua condição de saúde, que pode ter causado agitação. “Como um paciente de 59 anos, com 55 kg, pode ser tratado de forma tão violenta? Por que um policial não utilizou uma abordagem menos letal, como uma arma de choque?”, questionou.
Vazamento de informações
Luiz Henrique relata que, antes mesmo de chegar ao hospital, vídeos gravados dentro da UTI começaram a circular, expondo a situação de seu pai. “É revoltante que vídeos tenham vazado e que houvesse pronunciamentos de órgãos oficiais, antes mesmo da família ser informada. Isso é desumano e ilegal”, desabafou.
Transferência para UTI
Conforme a família, no dia 15, o paciente foi transferido para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de Morrinhos, com o quadro clínico considerado estável. Entretanto, dias depois, ele começou a questionar a necessidade da internação. “No sábado, dia 18, o médico plantonista me disse que ele não tinha mais perfil para estar na UTI, que estava lá apenas por protocolo para administrar insulina em bomba e antibióticos”, afirmou o filho da vítima.
Ainda segundo o filho, Luiz Cláudio aparentava estar se recuperando bem. Residente em Goiânia, Luiz Henrique visitou o pai no hospital no dia do ocorrido. “Quando o visitei, ele estava bem, conversando e brincando como sempre fazia”, afirmou. No entanto, naquela mesma noite, a família foi surpreendida por uma ligação do hospital solicitando a presença imediata de um familiar. E precisou retornar ao município.
Ação policial
Imagens divulgadas mostram que Luiz Cláudio foi contido após fazer uma enfermeira da unidade refém dentro da UTI, o que culminou no disparo de arma de fogo por um dos policiais. Luiz Henrique contesta a ação e critica a equipe médica. “A função da UTI é reabilitar pacientes. Por que o médico não interveio para acalmar a situação antes de chegar a esse ponto? Meu pai já havia sido imobilizado, não havia necessidade de um tiro”, afirmou.
O filho, que também é profissional de saúde, afirmou que o caso expõe uma série de falhas. “Foi incompetência de todos os lados: do hospital, da equipe da UTI e da polícia. Isso não pode ser normalizado. Hoje foi meu pai, amanhã pode ser o de outra pessoa”, lamentou.
Investigação e Justiça
A família afirma que levará o caso à Justiça e exige respostas. “Queremos que os responsáveis sejam responsabilizados. Meu pai merecia respeito, e o mínimo que podemos fazer agora é lutar para que essa situação nunca mais se repita”, concluiu.
Em nota divulgada nas redes sociais, a Prefeitura de Morrinhos expressou pesar pelo ocorrido e afirmou que o paciente estava internado no hospital há três dias. A gestão municipal também esclareceu que a gestão da UTI é de responsabilidade de uma empresa terceirizada, com contrato válido até março de 2025.
PM abriu procedimento administrativo para investigar o caso
A Polícia Militar de Goiás, em nota ao Mais Goiás, informou que, no sábado (18), uma equipe do 36º Batalhão atendeu uma ocorrência no Hospital Municipal de Morrinhos, onde um paciente em surto psicótico fez uma enfermeira refém na UTI, ameaçando-a com vidro.
Após tentativas de negociação, diante do risco à vítima, foi necessário disparar para neutralizar a agressão. Mesmo ferido, o paciente continuou a resistir e faleceu após socorro médico. A ocorrência foi acompanhada pelo delegado plantonista e será investigada, com procedimento administrativo aberto pela PM.
Nota da Prefeitura de Morrinhos na íntegra:
A Prefeitura de Morrinhos lamenta profundamente o ocorrido na noite do último sábado, 18 de janeiro, quando um paciente em surto psicótico fez uma enfermeira refém na UTI onde estava hospitalizado há três dias.
Em virtude da gravidade da situação e do iminente risco à vida da profissional, a Polícia Militar foi acionada para conduzir as negociações com o paciente.
Diante da infrutífera negociação, a Polícia Militar realizou um disparo que ocasionou no óbito do paciente.
Informamos que a gestão da UTI onde o fato aconteceu é de responsabilidade de uma empresa terceirizada, com contrato vigente até março de 2025.
A atual gestão reafirma seu compromisso com a transparência, mantém-se à disposição para esclarecer os fatos e lamenta profundamente a morte do paciente.
Solidarizamo-nos com a família enlutada e asseguramos que será oferecido acompanhamento psicológico e social tanto aos familiares quanto à enfermeira e demais envolvidos na situação.
Nota da Polícia Militar de Goiás na íntegra:
A Polícia Militar de Goiás informa que, na noite de sábado (18), uma equipe do 36º Batalhão da Polícia Militar atendeu uma ocorrência no Hospital Municipal de Morrinhos, onde um paciente, em surto psicótico, manteve uma técnica de enfermagem refém na UTI, ameaçando-a com um objeto perfurocortante (pedaço de vidro).
Após a chegada dos policiais, foram iniciados protocolos de gerenciamento de crises para liberar a vítima. Apesar das tentativas de verbalização para que o autor liberasse a vítima, ele permaneceu em atitude agressiva e reiterou as ameaças.
Diante do risco iminente à vítima, foi necessário a realização de um disparo de arma de fogo para neutralizar a agressão e resguardar a integridade física da refém.
Mesmo alvejado, o autor continuou resistindo, sendo necessária a sua contenção pelos demais policiais militares. A equipe médica prestou socorro imediato, mas infelizmente ele não resistiu aos ferimentos e veio a óbito.
A ocorrência foi acompanhada pelo delegado plantonista, que conduzirá as investigações cabíveis.
A Polícia Militar informa, ainda, que foi determinada a instauração de procedimento administrativo para apurar os fatos.