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Quase 40 anos depois, vítimas do Césio-137 ainda sofrem com abandono e doenças graves, revela documentário

“O césio acabou com a minha vida e com a minha família", diz um dos contaminados pela radiação

Irmãos se abraçam antes de embarque de um deles para tratamento no Rio de Janeiro, em 1987 (Foto: Carlos Costa)
Irmãos se abraçam antes de embarque de um deles para tratamento no Rio de Janeiro, em 1987 (Foto: Carlos Costa)

O brilho azul do Césio-137 marcou para sempre a vida de milhares de pessoas em Goiânia. Décadas depois da tragédia, as vítimas ainda convivem com doenças graves, preconceito e a luta constante por assistência médica e dignidade. O acidente começou silenciosamente, em setembro de 1987, quando dois catadores encontraram a cápsula de césio em um aparelho de radioterapia abandonado em uma clínica desativada. Durante dias, o pó radioativo circulou em residências e provocou contaminações em cadeia.

Foi apenas em 27 de setembro de 1987 que a notícia sobre o que realmente era aquela substância, material altamente radioativo, foi descoberta e divulgada às autoridades e à população. A partir dali, o País mergulhou em uma tragédia sem precedentes. O MaisGoiás.doc revela detalhes inéditos diretamente dos bastidores de quem viveu a tragédia na pele. Assista abaixo:

Donizethe Rodrigues, autônomo, faz parte do Grupo 2 de atingidos. Ele relembra que sua vida mudou drasticamente após a contaminação. “O césio acabou com a minha vida e com a minha família. Minha esposa estava grávida na época e também foi contaminada. Desde então, sofro com problemas de saúde que não me deixam viver em paz.”

Hoje, Donizethe enfrenta uma lista de complicações médicas: já sofreu infartos, carrega uma hérnia na barriga e lida com infecções que não consegue tratar adequadamente. O valor que recebe de aposentadoria, R$ 954, é insuficiente até para comprar remédios. “Esse dinheiro mal dá para comer, quem dirá para pagar os medicamentos que preciso. A gente se sente abandonado”, lamenta.

Donizethe Rodrigues, autônomo e vítima do Césio 137 (Foto: Mais Goiás)
Donizethe Rodrigues, autônomo e vítima do Césio 137 (Foto: Mais Goiás)

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O sentimento de abandono é reforçado por Marcelo Santos Neves, vítima do acidente e hoje presidente da Associação das Vítimas do Césio-137. Ele faz parte do Grupo 3 de contaminação e atua diariamente na defesa dos sobreviventes. “A nossa luta é para garantir o mínimo de dignidade a essas pessoas. Muitas delas convivem com sequelas físicas graves, dificuldades financeiras e, principalmente, marcas emocionais profundas. O índice de depressão entre as vítimas é altíssimo. Elas carregam não apenas as doenças no corpo, mas também a dor do preconceito e da falta de apoio”, afirma.

Marcelo explica que a associação busca apoio jurídico, psicológico e médico, mas esbarra na falta de políticas públicas voltadas especificamente para os contaminados. “O acidente aconteceu há quase quatro décadas, mas para nós ele nunca acabou. Todos os dias alguém sofre, adoece ou morre em consequência direta daquela radiação. O que pedimos é respeito e atenção do Estado, porque não somos apenas números, somos vidas que foram destruídas.”

Marcelo Santos Neves, presidente da Associação das vítimas do Césio 137 (Foto: Mais Goiás)
Marcelo Santos Neves, presidente da Associação das vítimas do Césio 137 (Foto: Mais Goiás)

O relato de Donizethe e o apelo de Marcelo refletem a realidade de centenas de sobreviventes. Apesar do tempo, os efeitos da radiação seguem presentes no corpo e na memória dos atingidos, que ainda lutam para serem vistos e amparados pelo poder público.

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