Cineastas protestam contra classificação indicativa de Aquarius
Anna Muylaert e Gabriel Mascaro disseram que não irã se inscrever no Oscar em retaliação
Aquarius, novo filme de Kléber Mendonça Filho, está envolvido em outra polêmica. O filme, aplaudido em sua pré-estreia em Recife e no Festival de Cannes, no qual foi o único filme latino-americano selecionado, recebeu uma classifcação indicativa de 18 anos no Brasil.
A polêmica é que os cineastas brasileiros discordam da classificação e a estão chamando de censura: o diretor e elenco do filme protestaram em Cannes contra o presidente interino Michel Temer, chamando o processo de impeachment de golpe de estado.
A repercussão começou pela classificação de 18 anos por “consumo de drogas” e “sexo explícito”. Para diversos cineastas e para Sônia Braga, principal atriz do longa, e para Mendonça Filho, a classificação é uma de várias tentativas por parte do governo de boicotar Aquarius.
Produtores e cineastas chegaram a enviar um recurso ao governo para modificar a classifcação, mas até agora nada. O principal argumento é que os filmes Tatuagem, de Hilton Lacerda, e Boi Neon, de Gabriel Mascaro, possuem cenas de sexo quase explícito e receberam uma classificação de 16 anos. Alguns críticos deram eco ao protesto, ressaltando que filmes como A Paixão de Cristo, notório por sua violência, chegou a receber classificação de 14 anos.
Em entrevista à revista Época durante a pré-estreia em Niterói (RJ), Sônia Braga chamou a classificação etária de “absurda”: ” Um filme como este não justifica essa classificação. Meu grande interesse no Brasil hoje é a juventude, que tem uma opinião importante. Não permitir que essas pessoas tenham acesso a essa cultura significa cercear essa liberdade. Na minha época, os filmes censurados eram simplesmente cortados. Hoje em dia, um jovem de 15 anos, que já está na internet, que assiste a filmes estrangeiros, é que está definindo o futuro. Essa plateia é importante, quero saber como eles se colocam”.
Segundo ela, as cenas de sexo do filme são flashes “muito rápidos” e que a cena de violência envolve apenas um tubarão na praia.
Logo, a diretora Anna Muylaert declarou que desistiu de inscrever seu novo filme Mãe só há uma na disputa pelo filme brasileiro que irá representar o Brasil na seleção do Oscar. Ano passado ela foi selecionada com Que Horas Ela Volta? e já havia sido selecionada antes com O Ano em que meus pais saíram de férias. À Folha de São Paulo, ela disse que este “é o ano de Aquarius. Não há porque entrar nesta disputa”.
Além de achar que Aquarius merece a indicação, a sua retirada é um protesto. À Folha, Anna disse que Kléber enfrenta um processo de seleção parcial e com uma agenda política clara que busca retaliar pelo protesto em Cannes: “A escolha de Petrucelli [crítico de cinema vocalmente contra Aquarius] foi uma escolha parcial”, disse a cineasta.
A ela se juntou Gabriel Mascaro, de Boi Neon, que também não vai submeter seu filme para a pré-seleção do Oscar. Ele publicou uma nota no Facebook, dizendo: “É lamentável que o Ministério da Cultura, por meio da Secretaria do Audiovisual, endosse na comissão de seleção um membro que se comportou de forma irresponsável e pouco profissional ao fazer declarações, sem apresentação de provas, contra a equipe do filme Aquarius, após o seu protesto no tapete vermelho de Cannes. Diante da gravidade da situação e contrários à criação de precedentes desta ordem, registramos nosso desconforto em participar de um processo seletivo de imparcialidade questionável”.
Sônia disse à Época que a atitude do governo foi um tiro no pé que irá chamar muito mais a atenção para o filme: “Quando você vê as pessoas de cultura se unindo, eu penso: “Será que isso é o máximo?”. O bom seria que todos competissem. Mas, se há algo que não é justo, precisamos nos unir. A classe artística se movimenta sempre pela democracia, já que tem o poder de divulgar tudo isso. Agora virou uma causa”.