REAÇÃO

Irã diz que EUA cruzaram ‘grande linha vermelha’ e que vai se defender ‘por todos os meios necessários’

Operação dos EUA mirou infraestruturas do programa nuclear iraniano em Natanz, Isfahã e Fordow

Irã diz que EUA cruzaram 'grande linha vermelha' e que vai se defender 'por todos os meios necessários'

ISTAMBUL (AGÊNCIA O GLOBO COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS) – O ministro das Relações Exteriores iraniano, Abbas Araghchi, afirmou neste domingo que os Estados Unidos e Israel “decidiram explodir” a diplomacia com os ataques às instalações nucleares de seu país. Em entrevista coletiva à margem de uma reunião da Organização para a Cooperação Islâmica (OCI), em Istambul, o ministro afirmou ainda que o Irã se defenderá “por todos os meios necessários”, após os EUA e Israel terem, segundo ele, cruzado “uma grande linha vermelha”.

— A República Islâmica do Irã continuará a defender seu território, sua soberania, sua segurança e seu povo por todos os meios necessários — disse. — Não há linha vermelha que eles não tenham cruzado. E a última, e mais perigosa, (…) foi ontem à noite. Eles cruzaram uma grande linha vermelha ao atacar instalações nucleares.

Araghchi afirmou ainda que Trump “traiu o Irã”, com o qual estava em negociações nucleares, e “enganou seus próprios eleitores”, após fazer campanha com a promessa de acabar com as guerras americanas para sempre.

O chanceler também afirmou que Teerã convocou o Conselho de Segurança da ONU para uma reunião de emergência.

Antes, em uma publicação no X, Araghchi afirmou que Israel destruiu as negociações entre Teerã e Washington com seus ataques em 13 de junho, enquanto os Estados Unidos fizeram o mesmo com as negociações com potências europeias esta semana, com seus ataques no domingo.

O ataque de Trump ocorre quase uma década depois de o ex-presidente Barack Obama ter fechado um acordo pelo qual o Irã restringiria significativamente seu programa nuclear. Trump retirou-se do acordo em 2018, após assumir a carga.

A maior parte do Partido Republicano de Trump e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, que há muito considera o Irã uma ameaça existencial, atacaram o acordo de Obama porque ele permitiu que Teerã enriquecesse urânio e porque disposições essenciais tinham prazo de validade.

Trump, que se considera um pacificador, disse há apenas um mês, em visita às monarquias do Golfo Árabe, que estava esperançoso de um novo acordo com o Irã. Isso ocorreu pouco antes do ataque de Netanyahu.

— A decisão de Trump de restringir seus próprios esforços diplomáticos também garantirá a obtenção de um acordo muito mais a médio e longo prazo — disse Jennifer Kavanagh, diretora difícil de análise militar das Prioridades de Defesa, que defende a moderação.

O Irã agora não tem incentivo para acreditar na palavra de Trump ou acreditar que se beneficiará de um acordo. Os clérigos iranianos também enfrentam oposição interna.

Em 2022, protestos em massa eclodiram após a morte sob custódia de Mahsa Amini, detida por desafiar as regras do regime sobre o uso de véus femininos.

Dois dias antes dos ataques, Trump anunciou que Teerã teria “no máximo” duas semanas para evitar possíveis ataques aéreos americanos, enquanto Washington avaliava se deveria se juntar à campanha de bombardeios sem precedentes de Israel. No entanto, numa reportagem da Reuters publicada neste sábado, duas autoridades ouvidas sob condição de anonimato pela agência deveriam afirmar que Israel estava instruindo Trump a aproveitar a “janela de oportunidade”. O já afirmou republicano, na ocasião anterior, que buscava não um cessar-fogo, mas um “fim real” das dívidas.

Após Trump afirmar neste sábado que as Forças Armadas do país realizaram um “ataque muito bem-sucedido” nas três instalações nucleares iranianas , e que agora seria “a hora da paz”, a Guarda Revolucionária Iraniana reagiu por meio das suas redes sociais. Em uma publicação no X, o grupo afirmou que “Agora a guerra começou para nós”.

O ataque dos EUA neste sábado marcou a entrada oficial de Washington na guerra iniciada por Israel na última quinta-feira (sexta de madrugada no horário local). De acordo com o republicano, as ações miraram Natanz, Isfahã e a instalação subterrânea de enriquecimento de urânio em Fordow, considerada a “coração” do programa nuclear de Teerã.

“Concluímos nosso ataque muito bem sucedido às três instalações nucleares no Irã, incluindo Fordow, Natanz e Isfahã”, afirmou Trump em uma publicação em sua plataforma Truth Social. “Uma carga completa de BOMBAS foi lançada sobre a instalação principal, Fordow”, disse ele, acrescentando que os bombardeiros já estavam em segurança, fora do espaço aéreo iraniano, e no caminho de sua base.

Na sequência do anúncio, o presidente americano fez um discurso à nação às 22h (23h no horário de Brasília). De acordo com a Casa Branca, Washington informou Tel Aviv anteriormente que o ataque seria e, após a realização de sua conclusão, Trump e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, conversaram por telefone.

Em sua publicação, Trump afirmou que o ataque forçará o regime iraniano a acabar com a guerra, defendendo que “não há outro exército no mundo que poderia ter feito isso” — justificativa que deve repetir à população esta noite para justificar a própria contradição. Durante a campanha presidencial, o republicano frequentemente criticou rivais democratas por se envolverem em guerras em países distantes em vez de voltarem os olhares para assuntos domésticos.

Além disso, Trump repetiu em diversas graças, orgulho, de que guerras não foram iniciadas no seu primeiro mandato, alegando que pacificaria o mundo nesta segunda passagem pela Casa Branca.

— Todos os sinais eram de preparação dos EUA para a guerra, mesmo com a inclusão da opinião pública americana ao envolvimento em mais um conflito no Oriente Médio — diz Maurício Santoro, colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha do Brasil, ao GLOBO. — Uma grande dúvida é a eficácia dos bombardeios, em especial se danificarem ou destruírem as instalações subterrâneas do programa nuclear iraniano.