ANÁLISE

PEC da Blindagem pode ter constitucionalidade questionada no STF, diz especialista

Existem argumentos de que o texto pode ferir princípios fundamentais da Constituição, como o da igualdade, o da moralidade administrativa e o da independência dos poderes

PEC da Blindagem pode ter constitucionalidade questionada no STF, diz especialista
PEC da Blindagem pode ter constitucionalidade questionada no STF, diz especialista (Foto: Marcos Oliveira - Agência Senado)

Aprovada na Câmara dos Deputados e com destino ao Senado, a proposta de emenda à Constituição (PEC) da Blindagem pode ter a constitucionalidade questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). Ao Mais Goiás, o professor e advogado constitucionalista, Clodoaldo Moreira, afirma que “a constitucionalidade da PEC é um ponto de intensa controvérsia”. Segundo ele, existem argumentos de que o texto pode ferir princípios fundamentais da Constituição, como o da igualdade, o da moralidade administrativa e o da independência dos poderes.

“Ao exigir o aval do Legislativo para a abertura de processos e para a manutenção de prisões em flagrante, e ao restringir as medidas cautelares a serem expedidas apenas pelo STF, a PEC pode ser interpretada como uma tentativa de limitar indevidamente a atuação do Poder Judiciário. Além disso, a ampliação do foro privilegiado a presidentes de partidos, sem que estes exerçam função pública eletiva, pode ser vista como uma distorção do instituto, que visa proteger a função, não a pessoa. Há juristas que defendem que a PEC atenta contra as chamadas ‘cláusulas pétreas’, que são dispositivos constitucionais que não podem ser alterados, mesmo por emenda, por representarem o núcleo essencial da nossa ordem jurídica”, argumenta.

Para ele, sob uma perspectiva de aprimoramento democrático e combate à impunidade, a PEC da Blindagem representa um retrocesso significativo. “A exigência de aval do Legislativo para a abertura de processos criminais contra parlamentares, derrubada em 2001 após intensas críticas, foi uma conquista. Sua reintrodução, especialmente com a previsão de voto secreto, reacende o temor de que o Congresso possa se tornar um escudo para condutas ilícitas, dificultando a atuação do sistema de Justiça e minando a confiança popular nas instituições.” Ele pontua que a história recente mostra que a prerrogativa de foro, quando mal utilizada, pode se converter em privilégio, afastando a ideia de que todos são iguais perante a lei.

Questionado sobre os possíveis interesses dessa aprovação na Câmara, Clodoaldo afirma que estes parecem ser multifacetados e, em grande parte, corporativos. Ele vê uma clara busca por autoproteção e por uma maior margem de manobra para parlamentares e líderes partidários diante de investigações e processos judiciais. Segundo ele, a negociação política que levou à sua aprovação, inclusive com a reinserção do voto secreto após manobras regimentais, sugere um movimento de blindagem da classe política. “Em um cenário de crescente judicialização da política e de operações de combate à corrupção, a PEC surge como uma resposta do Legislativo para reequilibrar forças, mas com o risco de comprometer a transparência e a responsabilização.”

Assembleias Legislativas

Clodoaldo esclarece que, após aprovação no Congresso, é possível que a blindagem se estenda aos deputados estaduais nas Assembleias Legislativas, caso estes apresentem projetos semelhantes. “A Constituição Federal estabelece que os princípios da imunidade parlamentar aplicáveis aos membros do Congresso Nacional são extensíveis, no que couber, aos deputados estaduais. Se a PEC da Blindagem for aprovada e promulgada, criando um novo paradigma de proteção para parlamentares federais, é muito provável que projetos de emenda às Constituições Estaduais sejam apresentados nas Assembleias Legislativas para replicar essas novas prerrogativas. Isso geraria um efeito cascata, ampliando a ‘blindagem’ para o âmbito estadual e, consequentemente, aumentando as preocupações com a efetividade do controle judicial sobre a classe política em todos os níveis federativos”, finaliza.

PEC da Blindagem no Senado

    Enquanto a Câmara dos Deputados aprovou com apoio expressivo da bancada goiana a PEC da Blindagem, a proposta deve enfrentar forte resistência no Senado Federal. Três representantes de Goiás já anunciaram posição contrária e avaliam que o texto pode ser barrado ainda na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ): o senador licenciado Vanderlan Cardoso (PSD), Pedro Chaves (MDB) e Jorge Kajuru (PSB). Saiba mais AQUI.