Poluição

Com queimadas, poluição do ar fica até 3.360% além do tolerável nas cidades

A fumaça que encobriu Cuiabá na terça-feira (15) é um dos resultados mais danosos à…

A fumaça que encobriu Cuiabá na terça-feira (15) é um dos resultados mais danosos à saúde humana da poluição gerada pelas queimadas. E essas nuvens de CO (monóxido de carbono) atingem de forma intensa municípios de Mato Grosso, Acre e Rondônia, segundo dados do Lapis (Laboratório de Análise e Processamentos de Imagens de Satélite), ligado à UFAL (Universidade Federal de Alagoas).

O laboratório processou imagens de satélite feitas pela NASA (agência espacial norte-americana) das terças-feiras entre 25 de agosto e 15 de setembro, que revelaram índices de CO até 3.360% mais altos que o limite máximo estipulado como tolerável para o ser humano.

Segundo os dados informados pelo Lapis, Cuiabá registrou na terça um índice de 738 ppm (partes por milhão) de CO. Rio Branco alcançou índice próximo da capital mato grossense: 724 ppm. Porto Velho registrou 508 ppm. Em todos os casos houve alta em comparação à primeira data.

O conteúdo máximo aceitável de CO na atmosfera é de 50 partes por milhão.

Em cidades do interior os índices chegaram a marcas ainda piores, com 1.730 ppm em Guatá (MT), o que significa 35 vezes mais que o tolerável. O índice alcançou 1.335 ppm em Sinop, no norte do estado.

Para efeito de comparação, mesmo em um período seco e de mais poluição, Brasília registrou na terça-feira passada (08) um índice de 109 ppm de CO. Em cidades mais distantes das queimadas, como São Luís, o índice foi de 85 no mesmo dia.

O ar atmosférico tem uma concentração ideal de gases: 21% de oxigênio, 78% de nitrogênio e o restante é constituído de gás carbônico, vapor d’água e outros gases. Quando ocorre a eliminação de CO, este substitui o oxigênio na atmosfera. Quanto maior o teor de CO, menor o de oxigênio. O resultado disso é que as pessoas respiram uma concentração muito ruim de ar.
Ricardo Martins. pesquisador e professor de Pneumologia da UnB (Universidade de Brasília)

Concentração alta de partículas no ar pode levar à morte

De acordo com o Consumer Product Safety Commission (Comissão de Segurança de Produtos ao Consumidor), do governo dos Estados Unidos, os efeitos do CO na saúde dependem não só da concentração medida, mas da duração da exposição e do estado de saúde de cada indivíduo.

“A maioria das pessoas não sentirá nenhum sintoma devido à exposição prolongada aos níveis de CO de aproximadamente 1 a 70 ppm, mas alguns pacientes cardíacos podem sentir um aumento da dor no peito. Conforme os níveis de CO aumentam e permanecem acima de 70 ppm, os sintomas se tornam mais perceptíveis e podem incluir dor de cabeça, fadiga e náuseas. Em concentrações sustentadas de CO acima de 150 a 200 ppm, desorientação, inconsciência e morte são possíveis”, diz cartilha do órgão.

Ainda segundo Martins, viver em um local com esses índices de CO extremamente altos é até possível, “mas às custas de sérios danos à saúde.”

“Algumas pessoas não conseguem. A situação que os mapas mostram é de emergência. A situação é grave e deve estar causando mortes na região”, completa.

UPA em Cuiabá tem alta de 60% em atendimentos respiratórios

O aumento da poluição gera uma busca de mais pessoas por atendimento em unidades de saúde. Renan Mancio, médico da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) da Morada do Ouro, em Cuiabá, diz que, nos últimos 20 dias, houve um aumento aproximado de 60% de atendimentos relacionados a problemas respiratórios causados pela poluição do ar.

“A gente vem observando um aumento muito grande, por causa dessas queimadas, de síndrome respiratória: rinites, asmas”, afirma. “É importantíssimo a população ter consciência de que tem que ter bastante hidratação, aerossol. O clima está muito inóspito.”

Segundo dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Mato Grosso é o estado que concentra mais queimadas este ano no país, com 34.629 focos até o último dia 15. O estado é o único do país a ter os biomas Amazônia, Cerrado e Pantanal, que apresentam números elevados de incêndios este ano.

Segundo Humberto Barbosa, coordenador do Lapis, questões como o ano mais seco têm contribuído para alastramento do fogo. Condições meteorológicas de cidades no sul da Amazônia são “muito ruins” e só devem melhorar a partir do início da próxima semana, com previsão de chuvas intensas.

Ele afirma que as queimadas típicas desta época do ano na Amazônia estão sendo impulsionadas por variações de temperatura na superfície dos oceanos Atlântico e Pacífico. “O principal motivo é o fenômeno La Niña, em que há diminuição da temperatura na região central do Pacífico, afetando, entre outros aspectos, a distribuição das chuvas na Amazônia”, diz.

Segundo ele, o desmatamento da Amazônia também já pode ter contribuído por diminuir a umidade e reduzir a quantidade de chuvas no sul do bioma.