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Dez motoristas de aplicativo são assaltados por mês em Goiás, em média

Todos os meses, pelo menos 10 motoristas de aplicativo são vítimas de assaltos em Goiás.…

Em média, 10 motoristas de aplicativo são assaltados por mês em Goiás
Em média, 10 motoristas de aplicativo são assaltados por mês em Goiás (Foto: Reprodução - Internet)

Todos os meses, pelo menos 10 motoristas de aplicativo são vítimas de assaltos em Goiás. A informação é da Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP-GO), referente aos meses de janeiro a setembro de 2021. Apesar de o dado já expor a frequência com que os motoristas são vítimas da violência no estado, o órgão de segurança admite que o número de vítimas mensais deve ser ainda maior e mais preocupante. Isso porque, em muitos casos, os condutores não registram as ocorrências de furto e roubo. Além disso, quando registram, eles não especificam o tipo de ocupação que têm, o que acaba por não ser calculado nos dados estatísticos e dificulta a elaboração de estratégias de combate aos crimes.

De acordo com o relatório da SSP, em nove meses, Goiás registrou 45 ocorrências de furto contra os motoristas de aplicativo. Esse tipo de delito é caracterizado por casos em que o criminoso age sem violência ou grave constrangimento. Já as ocorrências de roubo são maioria: 50 casos. São nessas ocorrências que os condutores sofrem ameaças de morte, agressões e outros agravantes.

Dez motoristas de aplicativo são assaltados por mês em Goiás, em média

Todos os meses, pelo menos 10 motoristas de aplicativo são vítimas de assaltos em Goiás. (Arte: Niame / Mais Goiás)

Trauma para sempre

Em outrubro de 2019, o ex-motorista de aplicativo Mauro Fernando foi vítima de assalto enquanto trabalhava, em Goiânia. No momento do crime, ele foi baleado, perdeu os movimentos do lado esquerdo do corpo e, até hoje apresenta sequelas.

Na época, ele aceitou uma corrida que foi chamada por uma mulher. Mas, ao chegar no local, encontrou três menores de idade. Ele conta que, assim que viu os rapazes, estranhou a situação e questionou onde estaria a jovem do perfil. Uma moça apareceu na porta da residência, para encobrir a farsa, mas não entrou no veículo. Um dos jovens se sentou ao lado dele, enquanto outros dois foram no banco traseiro.

“Eu senti um clima estranho de cara. O que sentou do meu lado estava ansioso, ficava fazendo umas perguntas estranhas e sem nexo, tipo ‘quanto você ganha?’, ‘como foi o movimento hoje?'”, lembra Mauro.

Assim que chegou ao destino, os jovens mandaram o motorista prosseguir e anunciaram o assalto. “Apontaram um revólver para a minha cabeça e começaram também com as ameaças do tipo: a gente é menor de idade e nada vai acontecer, vamos matar você. E eu o tempo todo pedia pela minha vida, dizia que podiam levar tudo que quisessem, só não queria morrer”, afirma o ex-motorista.

Em média, 10 motoristas de aplicativo são assaltados por mês em Goiás

Arma usada no assalto contra o ex-motorista de aplicativo, Mauro Fernando, foi apreendida pela polícia (Foto: Reprodução – PM)

Disparos

Mauro conta que continuou dirigindo em meio às ameaças e percebeu que estava sendo levado para a mesma região onde, pouco tempo antes, um colega de profissão havia sido assassinado. A lembrança o deixou ainda mais ansioso.

Um dos assaltantes deu uma coronhada na cabeça de Mauro, que perdeu o controle da direção e bateu o veículo. Ele lembra que dirigia a 110km/h, próximo ao Residencial Canadá. Em seguida, o assaltante armado atirou contra ele três vezes. Um dos disparos atingiu o braço esquerdo e o segundo, a coluna.

“Eu ouvi um barulho muito alto. Dois deles saíram correndo, mas o que atirou também parecia atordoado e eu me fingi de morto para que ele não me procurasse mais. Senti meu corpo formigar, perdi o sentido e os movimentos, mas não entendia a gravidade das coisas”, relembra.

Socorro

Enquanto aguardava o socorro, Mauro lembra que gritava de dor e pedia ajuda às pessoas que passavam pelo local. “Lembro que perguntar para uma mulher se eles haviam atirado em mim, porque sentia que estava machucado, mas não entendia o que estava acontecendo. Naquele momento eu só pensava na minha esposa, na minha mãe, que sao as pessoas que eu mais amo na vida”, conta o ex-motorista.

Mauro explica que aos poucos perdeu os movimentos e sentia dificuldade para respirar. Nos minutos em que aguardou a chegada do Corpo de Bombeiros, ele viu a vida passar pela cabeça. “Vi momentos da minha vida, sentia medo de morrer, pedia ajuda a Deus, orava. É algo que não desejo para o meu pior inimigo”, afirma.

Na época do crime a Polícia Militar conseguiu prender dois suspeitos. Eles mostraram à PM onde esconderam uma arma, que foi apreendida. A corporação publicou um vídeo da versão de um dos suspeitos. Na versão do investigado, Mauro reagiu.

Sequelas

Até hoje Mauro enfrenta as sequelas do assalto que sofreu. Segundo o ex-motorista de aplicativo, ele ficou cerca de seis meses internado no Centro Estadual de Reabilitação e Readaptação Henrique Santillo (Crer) para tratamento.

Graças ao tratamento, Mauro tem uma vida com quase nenhuma limitação. Ele explica que o braço esquerdo, por exemplo, perdeu a força e ainda manca. Além disso, por conta dos fortes medicamentos, desenvolveu alguns problemas de saúde. Mas, a situação é, segundo ele, bem melhor que na época, em que qualquer toque no lado direito do corpo dele, era motivo de dor. “Hoje estou bem, graças a deus”, comemora

Por conta de tudo que viveu, Mauro desistiu da ocupação. Ele revela que sente pânico de alguém que ele não conheça entre no carro dele. “Hoje não consigo trabalhar mais. Afeta todo o emocional, tudo fica abalado, é uma pressão gigante”, diz ele.

Mauro Fernando em época em que estava internado no Crer para recuperação (Foto: Arquivo pessoal)

Por quê assaltam os motoristas de aplicativo?

Mauro, vítima do assalto, acredita que a impunidade é um dos fatos que levam os motoristas de aplicativo a serem vítimas de assaltos. Um segundo fator, na opinião dele, é a venda dos automóveis para uso de drogas e ostentação. “A maioria rouba para pegar o carro, vender e ostentar, ir pra festa, usar drogas, e ai vai indo”, considera.

Ao Mais Goiás, investigadores da Delegacia Estadual de Repressão a Furtos e Roubos de Veículos Automotores (DERFRVA), Francisco José da Silva Costa e Iury Peterson, buscaram explicar motivos que levam os criminosos à cometerem tantos assaltos contra os motoristas de aplicativo.

“Geralmente, a motivação do roubo a motorista de aplicativo é pela facilidade na subtração do veículo. Os criminosos visam levar o veículo e celulares do motorista com o objetivo de venderem”, aponta Iury.

“Via de regra, eles se passam por clientes, solicitam uma corrida pelo app e durante o trajeto anunciam o assalto. Em geral, utilizam o veículo para fuga e, logo em seguida, o abandonam”, complementa Francisco José.

Suspeito de roubar motorista de aplicativo junto com menores é preso em Goiânia

Suspeito de roubar motorista de aplicativo junto com menores é preso em Goiânia (Foto: Divulgação – PC)

Neste mês de dezembro, a Polícia Civil prendeu Anaximandro do Nascimento Lopes, suspeito de roubar um motorista de aplicativo com o apoio de dois menores de idade. Durante a denúncia, a vítima relatou ter sido fortemente ameaçada pelos homens, que estavam armados. No mesmo dia, horas depois, os policiais encontraram o carro abandonado em outro bairro. Aos policiais, Anaximandro disse que ‘entrou no veículo sem saber que os comparsas iriam rouba-lo’.

Casos de motoristas de aplicativo assassinados

O Mais Goiás questionou a SSP acerca dos dados de latrocínio, ou seja, roubo seguido de morte. No entanto, o órgão afirmou não ter registrado nenhum caso. Mas isso não significa que eles não tenham ocorrido, ou mesmo, que algum condutor não tenha sido assassinado enquanto trabalhava ao longo de 2021.

Prova disso, é que em 6 de julho deste ano a Polícia Civil prendeu dois homens suspeitos de matarem um motorista de aplicativo queimado vivo em Trindade. O crime, segundo a investigação, foi uma emboscada.

Violência deve ser ainda maior

Segundo a Secretaria de Segurança Pública, os dados enviados ao Mais Goias possuem alguns pontos que devem ser levados em consideração. O primeiro deles, é que os dados estão sujeitos à variações a medida que forem investigados e concluídos. Ou seja, podem tanto diminuir ou aumentar.

Por fim o órgão afirma que o preenchimento da profissão é um ponto facultativo nos boletins de ocorrência. O que, em outras palavras, pode significar haver mais casos que não estão devidamente cadastrados.

Na opinião de Mauro, muitos motoristas não denunciam por não acreditarem na justiça. “Eles acham que a polícia é quem faz justiça. São leigos e não entendem os processos das coisas”, diz o ex-motorista.

Segundo o delegado Iury Peterson, chega a ser rotineiro que os motoristas de aplicativo registrem ocorrências do roubo. Todavia, muitas vezes faltam dados importantes, tais como o IMEI do aparelho telefônico e saber o local exato da ocorrência.

O investigador Francisco José pede para que os condutores, caso passem pela situação de violência, registrem os crimes. “Estamos tendo um alto índice de resolutividade nos casos de roubo a motorista de app. Temos diversas ferramentas que permitem a rápida identificação e prisão dos criminosos, bem como a recuperação dos objetos subtraídos, razão pela qual é fundamental que as vitimas registrem a ocorrência em todos os casos”, reforça.

Como se proteger?

De acordo com os dois delegados ouvidos pela reportagem, existem algumas recomendações de segurança para se previnir dos assaltos. “Viagem muito tarde e para local ermo, sempre o motorista tem de ficar em alerta”, afirma Iury.

Outra recomendação, é que os trabalhadores tomem cuidado com perfis falsos. Segundo Iury e Francisco, geralmente, os infratores utilizam perfis falsos femininos, mas quando o motorista chega para buscar o cliente são dois homens. “E lembre-se de nunca reagir ao assalto”, reforça Francisco.

O que dizem as plataformas

Os princiais aplicativos de viagem usados em Goiás são das empresas Uber e 99 Pop. Consequentemente, são eles que possuem também a maior parte dos motoristas de aplicativo. No que diz respeito à segurança dos trabalhadores, cada empresa possui medidas de proteção individuais, mas também semelhantes. Confira:

Uber e 99 Pop

  • Verificação de usuários: O usuário que quiser pagar somente em dinheiro precisa inserir o CPF e a data de nascimento para ter acesso ao aplicativo – dados que são conferidos com a base de dados do governo federal para confirmar sua identidade. Além disso, possui verificação por cartão de crédito.
  • Viagem analisada: Uso de ferramenta que pode bloquear as viagens consideradas potencialmente mais arriscadas, a menos que o usuário forneça detalhes adicionais de identificação.
  • Verificação de viagens: Em algumas viagens, passageiros devem dizer um código exclusivo de 4 dígitos. Nesses casos, o motorista só inicia a viagem depois de digitá-lo. Segundo a Uber, isso ajuda o condutor a confirmar que o passageiro certo está entrando no seu carro.
  • Detecção de mensagens inapropriadas: Mensagens enviadas no bate-papo do app que possam ser consideradas ofensivas ou que ameacem a integridade de uma pessoa entram automaticamente em um processo de desativação permanente da conta original.
  • Registro por GPS: Todas as viagens da Uber têm registro de GPS, do início ao fim. Caso algo aconteça, tudo está registrado.
  • Ligação para a polícia: Essa função apresenta uma opção de ligar diretamente para a polícia em situações de risco ou emergência. Ao apertar o botão, o app mostrará sua localização atual para que tanto o motorista, como o passageiro possam compartilhar com as autoridades locais que são responsáveis pelo número 190.
  • Checagem de rota: Através de sensores e dados de GPS, uma ferramenta identifica se a viagem teve uma parada longa que não estava programada. Se sim, a empresa envia uma notificação com as ferramentas necessárias para tanto o motorista, como o passageiro buscarem ajuda.
  • Gravação de áudio: Motoristas podem gravar o áudio de uma viagem, sempre que se sentirem desconfortáveis. O conteúdo é criptografado e pode ser enviado para a Uber por meio de um relato de segurança e, em caso de necessidade, utilizado para investigações ou compartilhado com autoridades, se isso for exigido legalmente.
  • Sistema de avaliações: A empresa registra viagens com avaliações baixas e pode remover usuários para proteger os outros motoristas e usuários.
  • Atendimento 24 horas: A companhia tem equipes de respostas a incidentes disponíveis para atender a qualquer horário, dia ou noite.

Medidas em teste

Além das medidas mencionadas, há algumas formas de proteção que não estão disponíveis para todos os usuários da plataforma. Isso porque, elas ainda estão sendo testadas. Confira:

  • Aceitar viagens em dinheiro: O motorista pode escolher se vai aceitar corridas em que o método de pagamento vai ser em dinheiro e cartão ou somente cartão.
  • Viagens com passageiras mulheres: Motoristas mulheres podem escolher receber viagens apenas de passageiras mulheres.
  • Informações do usuário: Motorista poderá visualizar o destino e se o usuário possui menos de 5 viagens na plataforma, antes de aceitar a solicitação da chamada.
  • Viagens gravadas por câmeras: Câmeras de segurança ajudam a inibir a ação de criminosos e oferecem ainda mais proteção durante as corridas. Elas filmam todo o interior do veículo, possuem alto-falante, microfone, visão noturna e botão de emergência com suporte 24h capaz de enviar alerta para a Central de Segurança.

*Larissa Feitosa compõe programa de estágio do Mais Goiás sob supervisão de Hugo Oliveira.