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Com gay nazista e ex-lésbica, Bad Gays tira o glamour dos LGBTQIA+

Ele dedicou a carreira a lutar pelo veganismo, cantou a descoberta da sexualidade de jovens…

(Foto: The Ultimate Music/Divulgação)
(Foto: The Ultimate Music/Divulgação)

Ele dedicou a carreira a lutar pelo veganismo, cantou a descoberta da sexualidade de jovens gays enrustidos e criticou fortemente a monarquia britânica -mas passou a apoiar publicamente um partido de extrema direita nos últimos anos.

Ela escreveu livros pioneiros da literatura lésbica em língua inglesa, reuniu em sua casa em Paris a nata do modernismo e foi uma importante colecionadora de arte -mas, mesmo sendo judia, ajudou a proteger oficiais do governo francês ligados ao nazismo, durante a Segunda Guerra.

Muito celebrados por suas obras, o cantor inglês Morrissey e a escritora americana Gertrude Stein costumam também ser citados como ícones do movimento queer, por terem levado uma vida não-heterossexual e trazido o tema da diversidade para o debate público, em letras de música, poemas e entrevistas.

Mas um podcast que finalizou há pouco sua quarta temporada chama a atenção para o lado problemático e menos palatável destes artistas e de outras figuras relevantes para a sigla LGBTQIA+.

“Bad Gays”, algo como gays do mal, reúne, em episódios de cerca de uma hora, histórias que colocam em xeque a noção de que ser gay signfica quebrar dogmas, aceitar o diferente ou se encaixar no campo progressista das ideias.
O primeiro episódio, por exemplo, é sobre Ernst Röhm, amigo pessoal de Hitler e seu auxiliar no auge do nazismo e um dos primeiros políticos a assumir sua preferência sexual por homens.

Outro programa dedica-se à vida do compositor britânico Benjamin Britten, simpatizante do comunismo, gay e atraído sexualmente por menores. Um terceiro conta a vida de Lisa Miller, que teve um filho com sua ex-parceira, se separou dela, passou a se dizer ex-lésbica e sequestrou a criança.

É muito interessante o pressuposto do programa, de problematizar a narrativa heróica na qual personagens LGBTQIA+ são quase sempre colocados. Ao jogar luz sobre gays nazistas que contribuíram para a perseguição de outros gays, ou de uma dupla homossexual de assassinos, “Bad Gays” deixaria de cabelos em pé parte da esquerda, pois mostra que orientação sexual não necessariamente significa progresso e não define caráter.

Outro ponto forte é o incômodo que o programa pode causar em pessoas LGBTQIA+, por forçar uma comunidade acostumada a celebrar a si mesma e a se ver cada vez mais assimilada pela sociedade a olhar para o seu lado desprezível.

Ao fazer isso, o podcast desperta no ouvinte um outro questionamento -há mesmo um movimento LGBTQIA+, um grupo diverso unido por uma bandeira em comum, qual seja, a luta pela aceitação ampla das diferenças de gênero e sexuais?

O podcast, escrito e apresentado por um escritor e por um pesquisador da história gay, não sofre de falta de originalidade em seu conteúdo, mas sim de edição no produto final. Com uma hora ou mais de duração, os episódios são intermináveis, e não há música ou outro efeito para tornar as narrativas dinâmicas.

Além disso, os apresentadores passam dezenas de minutos contando a vida dos personagens em ordem cronológica, algo cansativo e burocrático, antes de finalmente debaterem e contextualizarem as ações dos retratados.

Bad Gays” parece pensado para atrair um público que se interessa previamente pelo tema. Contudo, graças à complexidade dos personagens que aborda, contribui para o revisionismo da sigla LGBTQIA+ ao mostrar seu lado nada glamuroso.

BAD GAYS
Onde: Disponível nas plataformas de streaming
Autor: Huw Lemmey e Ben Miller
Link: https://badgayspod.com/listen
Idioma: Inglês
Avaliação: bom