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Falhou a única vacina em testes avançados contra o HIV. E agora?

Quatro décadas após sua descoberta, vírus ainda infecta 1,5 milhão de pessoas por ano e mata cerca de 650 mil

Vírus ainda infecta 1,5 milhão de pessoas por ano e mata cerca de 650 mil Falhou a única vacina em testes avançados contra o HIV
(Foto: Reprodução/Freepik)

A única vacina contra o HIV que ainda estava em testes clínicos em estágio avançado provou ser ineficaz, anunciou seu fabricante na quarta-feira (18), causando mais uma decepção num campo há muito marcado pelo fracasso.

Dezenas de vacinas candidatas a prevenir o HIV foram testadas e descartadas nas últimas décadas. A derrota mais recente atrasa em três a cinco anos o progresso na direção de um imunizante, disseram especialistas. Ainda assim, outras opções em testes em estágio inicial podem oferecer um poderoso baluarte contra o HIV.

A notícia é “decepcionante, mas não é o fim do esforço para desenvolver uma vacina”, disse em entrevista Anthony Fauci, que até dezembro liderou o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA. “Existem outras abordagens estratégicas.”

Um estudo em curso na África Oriental e Austral, chamado PrEPVacc, está avaliando uma combinação de vacinas experimentais contra o HIV e medicamentos preventivos. Os cientistas avançaram no desenvolvimento de anticorpos poderosos que podem neutralizar o vírus. E estão testando novas tecnologias de vacinas, incluindo de mRNA, contra o HIV.

Ainda assim, a perda da mais recente candidata ressalta os desafios de se desenvolver uma vacina para um adversário tão astuto quanto o HIV. Quatro décadas após sua descoberta, o vírus ainda infecta aproximadamente 1,5 milhão de pessoas por ano e mata cerca de 650 mil.

Para as pessoas em países mais ricos, o HIV não é a sentença de morte que já foi. Drogas poderosas podem suprimir o vírus em indivíduos infectados. Existem várias opções disponíveis para evitar a infecção: pílulas orais e injeções administradas a cada dois meses já estão aprovadas nos Estados Unidos, por exemplo, e uma injeção que só precisaria ser administrada a cada seis meses está em fase final de testes.

Mas esses medicamentos devem ser tomados pelo resto da vida do paciente e muitas vezes são inacessíveis para aqueles que mais precisam deles. Uma vacina seria a maneira ideal de deter o vírus.

“A modalidade de prevenção definitiva para qualquer infecção, especialmente infecção viral, é uma vacina segura e eficaz”, disse Fauci. “Essa é a razão pela qual o campo continuará realizando pesquisas muito ativas nessa área.”

O teste que agora termina, chamado Mosaico, começou em 2019 e foi liderado pela Janssen Pharmaceuticals, parte da Johnson & Johnson. Ele testou a vacina em 3.900 homens cisgênero (aqueles que sempre se identificaram como homens) e transgêneros que fazem sexo com homens cisgênero e transgênero, em mais de 50 locais em nove países da América do Norte, América do Sul e Europa.

A vacina continha um mosaico de componentes destinados a atingir vários subtipos diferentes de HIV presentes em todo o mundo. Mas a resposta imune que provocou contra o vírus não incluiu quantidades significativas dos chamados anticorpos neutralizantes, considerados as armas mais poderosas contra a infecção.

Embora o fracasso do teste não signifique o fim da abordagem em mosaico, ele sinaliza que uma vacina bem-sucedida deve estimular o corpo a produzir anticorpos amplamente neutralizantes, disse Fauci.

Depois de revisar os dados iniciais do estudo, um conselho independente de monitoramento de dados e segurança concluiu que, embora a vacina fosse segura, não evitava mais infecções por HIV do que um placebo. O conselho recomendou que a empresa interrompesse o teste e informasse os participantes.

O resultado não surpreendeu totalmente os especialistas, porque um estudo da mesma vacina, chamado Imbokodo, foi interrompido em 2021. Este testou a vacina em mulheres cisgênero em cinco países da África subsaariana.

O fracasso dos estudos é particularmente decepcionante, em parte porque foram financiados pela Johnson & Johnson, disse Mitchell Warren, diretor-executivo da organização de prevenção do HIV AVAC.”Não são muitas as empresas que se envolvem com vacinas para doenças infecciosas, então ver esta não chegar ao mercado é uma decepção e um retrocesso”, disse Warren.

A notícia deve levar os formuladores de políticas e ativistas a pensarem maneiras de tornar mais amplamente acessíveis as ferramentas existentes para prevenir o HIV, acrescentou ele. “Não é que toda a esperança esteja perdida, é que precisamos redirecionar nossos recursos para que tenham maior impacto.”

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