Lemann, Telles e Sicupira: Quem são os investidores de referência que podem ‘salvar’ a Americanas
Americanas divulgou ter encontrado “inconsistências financeiras” de R$ 20 bilhões em seu balanço

A Americanas passa pela fase mais difícil da sua história após encontrar “inconsistências financeiras” de R$ 20 bilhões. Sergio Rial (ex-Santander), que assumira como CEO da companhia havia apenas dez dias, deixou o cargo. Com isso, as ações da empresa caíram tanto na bolsa de valores que precisaram ser colocadas em leilão para ter uma queda controlada. Em nota, a Americanas informou que atuará junto a Rial e aos acionistas de referência para investigar o caso.
Os investidores de referência das Americanas são Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, que lideram o fundo de investimentos 3G Capital. Os três são os empresários por trás do sucesso da Anheuser-Busch InBev, criada em 2004, com a fusão da belga Interbrew e da brasileira Ambev. O investimento na Americanas foi o primeiro não financeiro do trio, que ficou na empresa por décadas, até sair do controle em 2021.
Em conferência realizada nesta quinta-feira, 12, Rial afirmou que o caso pode ter ocorrido ao longo dos últimos anos, ou seja, quando os investidores de referência ainda davam as cartas na empresa. Com a inconsistência financeira de cifra bilionária, a companhia precisa agora se capitalizar, e o investimento dos acionistas de referência é uma das possibilidades para tirar a empresa desse entrave.
Mesmo com o trio de investidores que podem financiar a recuperação da Americanas, a recuperação do negócio pode não dar certo, ou levar muito tempo para acontecer. “Eles não salvarão a empresa se não for viável. São pessoas que não gostam de perder dinheiro. Elas teriam interesse em recuperar a rentabilidade. Mas isso prova que não existem pessoas infalíveis. O que aconteceu é fruto de vários erros em sequência. Quantas pessoas deixaram passar o momento de corrigir os problemas? Essa é a questão. Mesmo com o trio de referência, o tempo de recuperação pode ser grande”, diz Felipe Cima, operador de renda variável da Manchester Investimentos.
Rial destacou o compromisso dos acionistas de referência com o negócio durante a conferência após sua renúncia como CEO da Americanas. No entanto, destacou que não deve ser a situação resolvida com uma simples injeção de capital. “Não pode ser a solução por si só. ‘Me dá um cheque e tá resolvido’, não é assim”, afirmou.
Em 2021, as Lojas Americanas fundiram suas operações com a B2W, que reúne as marcas Americanas.com, Submarino, Shoptime e Sou Barato. Com isso, os sócios da 3G Capital se tornaram os acionistas de referência, e não detêm mais do que 50% do capital votante do negócio.
Segundo analistas, a Americanas pode fazer uma operação de follow-on (emissão de novas ações na bolsa) para conseguir o aumento de capital necessário. Porém, a hipótese de uma recuperação judicial não é descartada pelos especialistas consultados pelo Estadão, uma vez que o apetite do investidor brasileiro por ações de varejistas já estava prejudicado devido ao cenário de redução do poder de compra e alta na taxa de juros e agora leva mais um baque. Analistas também afirmam que outros negócios do 3G Capital podem ser afetados pela crise de confiança desencadeada pelo caso de Americanas.
Em apenas um dia, a ação da varejista caiu 77%, uma queda de R$ 8 bilhões no seu valor de mercado. Segundo a TradeMap, é a terceira maior queda de ações em um único dia desde 2008.
Para Marcello Marin, diretor financeiro da empresa de contabilidade e gestão Spot Finanças, o rombo nas contas de Americanas pode ter um impacto negativo na reputação das varejistas. “Esse é um caso que estará nos livros de história. A governança é um ponto de atenção no mercado. Agora, as pessoas desconfiam que existam os mesmos problemas em empresas de varejo. Será preciso demonstrar que esses problemas não existem, o que é difícil”, afirma.
Joelson Sampaio, professor de economia da FGV, afirma que o caso é sério e tem impacto direto nos negócios. “Não temos precedentes no Brasil com essa magnitude de inconsistência financeira e isso causa a queda de preços na bolsa de valores. O que precisa ser apurado é a raiz do problema. É preciso saber se foi ética ou técnica, postura ou atitude”, diz.
Procurado, o 3G Capital não respondeu ao contato da reportagem.
Jorge Paulo Lemann
Jorge Paulo Lemann é apontado pela revista Forbes como um dos homens mais ricos do Brasil. No ano passado, ele liderava esse ranking ao desbancar Eduardo Saverin (um dos fundadores do Facebook). A fortuna de Lemann é estimada em R$ 72 bilhões.
Lemann é acionista controlador da gigante cervejeira AB Inbev e detém participações em conglomerados como Kraft Heinz e Restaurant Brands International (responsável por negócios como Burger King e Tim Hortons). No Brasil, Lemann tem em seu portfólio Lojas Americanas e São Carlos Empreendimentos.
Marcel Telles
Sócio de Lemann no fundo de investimentos 3G Capital, Marcel Telles possui uma fortuna estimada em R$ 48 bilhões, o que o coloca no ranking da Forbes como o terceiro homem mais rico do Brasil.
Mais afastado do dia a dia das empresas, Telles possui também participação de 9% na ClearSale, de análise e prevenção de fraudes.
Beto Sicupira
Também sócio da 3G Capital, Beto Sicupira integra o conselho de administração das Lojas Americanas, mesa que compartilha com Paulo Alberto Lemann, filho do sócio. Junto com sua família, Sicupira tem fortuna estimada em R$ 39,85 bilhões.