Economia

Tesouro lança título de ‘aposentadoria’ e mira público entre 2 e 6 salários mínimos

Nos 20 anos de programa que incluiu as pessoas físicas na negociação de títulos públicos, governo cria o Tesouro RendA+, para funcionar com opção de renda adicional à aposentadoria

Inadimplência do consumidor aumenta em janeiro, após 2 meses de queda
Inadimplência do consumidor aumenta em janeiro, após 2 meses de queda (Foto: Pixabay)

No aniversário dos 20 anos do programa Tesouro Direto, o governo criou um novo título público voltado especialmente para funcionar com uma renda adicional à aposentadoria. O título, que recebeu o nome de Tesouro RendA+, poderá ser comprado pelas pessoas físicas a partir de 30 de janeiro. O pagamento poderá ser feito por Pix.

É um título que entrará na cesta de papéis do programa Tesouro Direto de venda pela internet para atender investidores que querem complementar sua aposentadoria. Hoje, o valor máximo de aposentadoria que o INSS paga aos beneficiários é de pouco mais de R$ 7 mil.

Há um período de acumulação, no qual o aplicador não recebe o pagamento pelo Tesouro do fluxo de juros do papel, como ocorre com papéis com características semelhantes. Com o Tesouro RendA+, o aplicador escolhe uma data de aposentadoria e garante renda complementar por 20 anos (240 parcelas) após o vencimento do papel. Essas parcelas funcionam como aposentadoria complementar ou salário extra quando as pessoas estiverem mais velhas.

O decreto de criação do Tesouro RendA+ foi publicado, na semana passada, no Diário Oficial da União. Ele é um título da série NTN-B, que são papéis que garantem ao investidor a inflação oficial, o IPCA, mais uma taxa de juros. Hoje, os juros estão acima de 6% ao ano.

O valor recebido por 20 anos é mensalmente corrigido pela inflação, garantindo assim o poder de compra. Se a data da aposentadoria for em 2060, por exemplo, o investidor compra títulos com esse prazo de vencimento. Nessa data, ele passa a receber a renda até 2080. Serão ofertados oito prazos de vencimento, com intervalos de cinco anos, de 2030 a 2065.

Ao Estadão, o secretário do Tesouro Nacional, Paulo Valle, diz que o título dá opção de planejamento para a aposentadoria, demanda dos investidores do Tesouro Direto, que há duas décadas ampliou a base de investidores em papéis do governo federal. Até então, os títulos públicos não podiam ser comprados diretamente por pessoas físicas.

O foco do Tesouro RendA+, afirma ele, é a simplicidade. “É um produto simples. O investidor só tem de saber quando quer se aposentar e quanto quer receber”, diz. Um simulador no portal do Tesouro Direto faz a conta para o investidor e diz quantos títulos precisam ser adquiridos para o investidor receber a “aposentadoria” desejada. “Nosso foco era fazer um produto simples que qualquer cidadão entendesse, como o celular, que é um aparelho complexo mas todo mundo sabe utilizar”. O título foi inspirado no trabalho dos professores Robert Merton (Nobel Economia em 1997) e Arun Muralidhar, que introduziu o conceito de SeLFIES. Os SeLFIES são produtos financeiros que facilitam o processo de poupar para uma previdência complementar.

Público-alvo

O público-alvo para a compra do novo título do Tesouro Nacional que garante uma renda extra para a aposentadoria são os trabalhadores que ganham entre dois e seis salários mínimos, segundo o subsecretário de Regime de Previdência Complementar do Ministério da Previdência e Trabalho, Narlon Gutierre Nogueira.

“Temos destacado que o objetivo do novo papel de forma nenhuma é substituir a previdência pública”, ressalta. Segundo ele, o INSS tem um pacote amplo de benefícios, que vai muito além da aposentadoria. A previdência pública funciona como uma espécie de seguro que garante renda do trabalhador e de sua família em casos de doença, acidente, gravidez, morte ou idade avançada. Já o Tesouro RendA+, diz o subsecretário, é uma opção para quem deseja incrementar sua aposentadoria.

“Para o trabalhador com renda baixa, de um até dois salários mínimos, a taxa de reposição da previdência pública é bastante elevada”, ressalta. Isso significa que não há diferença muito grande entre o que o trabalhador recebe na ativa e o que ganha na aposentadoria.

Uma vantagem do novo papel, diz ele, é que a pessoa não tem de tomar todas as decisões que precisa fazer quando vai comprar uma previdência complementar, como, por exemplo, a escolha do seu plano e consequentemente a forma de tributação do Imposto de Renda.

“É para um público que tem mais dificuldade em ter o planejamento da previdência e colocamos uma opção adicional”, diz. Nesse grupo, estão os trabalhadores por conta própria, os chamados autônomos. Será possível começar a investir no Tesouro RendA+ com aproximadamente R$ 30.

Sem taxa de administração

O secretário do Tesouro, Paulo Valle, diz que o novo papel tem custo competitivo com os fundos de previdência privada. Além de não ter taxa de administração, o custo de custódia dos títulos na Bolsa de Valores (B3) tem taxa especial e pode chegar a zero se o investidor ficar com o papel até o vencimento. Essas vantagens podem compensar a tributação mais baixa do Imposto de Renda (IR) dos fundos de previdência, diz o secretário do Tesouro. Segundo Valle, nas aplicações em fundos de previdência a alíquota mais baixa pode ir até 10% para quem investir por mais de 10 anos. Já no título público a alíquota mais baixa do IR é de 15%.

Um dos problemas para a aposentadoria no Brasil é que a expectativa de vida do brasileiro vem aumentando e o custo de vida segue a mesma tendência. O valor da aposentadoria não é o suficiente para pagar as contas e despesas pessoais. Pesquisa do Tesouro mostra que há consenso que poupar para o longo prazo é essencial para o bem-estar familiar e a principal motivação para o planejamento previdenciário. Os dados mostraram que grande parte dos entrevistados acredita que vai precisar de uma renda igual ou superior à atual para cobrir os gastos durante a aposentadoria A maior parte acha mais fácil poupar uma vez ao mês.

Opções para resgate

O investidor escolherá uma entre oito datas disponíveis para começar a receber sua renda extra: 2030, 2035, 2040, 2045, 2050, 2055, 2060 e 2065. Até a data escolhida, ele poderá acumular mais do título escolhido, podendo fazer o agendamento de compras mensais. A todo momento, o investidor saberá o poder de compra real que ele já garantiu para a sua renda extra. Segundo Valle, para cada R$ 1 mil aplicados, o investidor garante R$ 4,16 por mês durante 20 anos. Se acumular R$ 1 milhão, terá R$ 4 mil por mês. “O ideal é comprar todo o mês”, recomenda.

Para estimular a cultura da poupança de longo prazo entre os brasileiros, o Tesouro fixou uma janela de 60 dias na qual o investidor não poderá vender o papel. Depois dessa carência de dois meses, o comprador poderá se desfazer do papel a hora que quiser.

Valle descartou ser uma tentativa de concorrência com os fundos de previdência abertos e fechados. Ao longo de 2022, durante os estudos para a implantação do novo papel, a medida foi debatida com a indústria de previdência complementar sem resistências, segundo o secretário.

Como funciona o Tesouro RendA+

O que é?

Um título para investidores que querem complementar a aposentadoria: o “A” é de aposentadoria adicional

Onde comprar?

Na cesta do programa Tesouro Direto de venda de títulos do Tesouro para pessoas físicas na internet

Quando começa?

A partir de 30 de janeiro

Como funciona?

O investidor escolhe uma data de “aposentadoria” e garante um salário complementar por 20 anos (240 parcelas). O salário recebido por 20 anos é mensalmente corrigido pela inflação, garantindo assim o poder de compra

Como começar a investir?

É possível começar a investir no Tesouro com R$ 30 (uma fração do valor título)

Como é a liquidez?

Diferentemente dos demais títulos do Tesouro Direto, o investidor não poderá vender nos primeiros 60 dias. A partir daí, a liquidez é diária

Como será aplicada a tributação?

Como um instrumento de renda fixa, apenas os rendimentos do título são tributados. Até 180 dias 22,5%; 181 até 360 dias, 20%; 361 até 720 dias, 17,5%; após 720 dias, 15%

O que acontece se o investidor morrer?

O investimento entra no espólio e vai para os herdeiros, que poderão vender os títulos

Simulações com remuneração de 6% ao ano mais inflação para quem quer receber ao menos 1 salário mínimo por 20 anos:

1) Quem quer se aposentar em 2065 (daqui a 42 anos)

Deve comprar o Tesouro RendA+ 2065 (começando o resgate mensal no dia 15 de janeiro de 2065) e investir por mês aproximadamente R$ 31,59 (esse valor aumenta com a inflação + taxa real) até 2065

2) Quem quer se aposentar em 2045 (daqui a 22 anos)

Deve comprar o Tesouro RendA+ 2045 (começa o resgate mensal no dia 15 de janeiro de 2045) e investir por mês aproximadamente R$ 193,21 (esse valor aumenta com a inflação + taxa real) até 2045

3) Quem quer aposentar em 2030 (daqui a sete anos)

Deve comprar o Tesouro RendA+ 2030 (começa o resgate mensal no dia 15 de janeiro de 2030) e investir por mês aproximadamente R$ 1.447,49 (esse valor aumenta com a inflação + taxa real) até 2030