julgamento

Vinte juízes são alvos do CNJ por fake news e campanha nas redes

Procedimentos citam divulgações de notícias falsas, questionamentos ao processo eleitoral, xingamentos a candidatos e até apoio a atos golpistas

Procedimentos citam notícias falsas e até apoio a atos golpistas Vinte juízes são alvos do CNJ por fake news e campanha nas redes

O plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) começará a julgar nesta terça-feira (14) uma reclamação disciplinar contra a juíza do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) Ludmila Lins Grilo, acusada de ter atacado ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em seu perfil nas redes sociais. Ela integra uma relação de 20 magistrados do país investigados pelo órgão por postagens político-partidárias. Os procedimentos citam divulgações de notícias falsas, questionamentos ao processo eleitoral, ofensas e xingamentos a candidatos e até apoio a atos golpistas.

Parte dos profissionais investigados já recebeu sanções. De acordo com um balanço atualizado do Conselho, obtido com exclusividade pelo GLOBO, além de Ludmila, outros seis juízes e quatro desembargadores tiveram suas contas nas redes sociais bloqueadas em razão de manifestações político-partidárias, no ano passado.

‘Conduta incompatível’

Em setembro, a magistrada passou a ser investigada por “conduta nas redes sociais incompatível com seus deveres funcionais”. Segundo o despacho do corregedor do CNJ, ministro Luís Felipe Salomão, Ludmila fez publicações com tom depreciativo sobre decisões do STF e da Justiça Eleitoral: “Ato autoritário é juiz abrir inquérito e figurar como vítima, investigador e julgador ao mesmo tempo. Como associada, aguardo manifestação da AMB sobre isso”, escreveu, fazendo referência ao inquérito das fake news, em andamento no Supremo, e cobrando um posicionamento da Associação dos Magistrados Brasileiros.

Em sua conta no Twitter, que era seguida por mais de 300 mil pessoas quando foi suspensa, a magistrada compartilhou uma postagem com o título “Os perseguidores-gerais da República do Brasil” e uma montagem com fotos dos ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, ambos do STF. Também pesa sobre ela a “aparente tentativa de auxiliar” o blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, alvo de inquéritos por disseminar desinformação e atacar integrantes da Corte. Em outro momento, a juíza chamou de “uma das maiores bizarrices da legislação eleitoral” a busca e apreensão realizada na casa do ex-juiz Sergio Moro quando ele disputava uma vaga ao Senado.

Na ocasião, Ludmila teve o perfil bloqueado por determinação do próprio Alexandre de Moraes. Atualmente, a juíza é alvo de outros processos administrativos no CNJ. Em um deles, aberto após ela veicular um conteúdo em que incentivou os seguidores a não usarem máscara sanitária em locais fechados durante a pandemia, foi mantida a pena de advertência aplicada pela Corregedoria do TJ-MG.

Também membro da Justiça estadual de Minas Gerais, o juiz Fabrício Simão da Cunha Araújo é apontado em um pedido de providências por ter supostamente levantado suspeitas sobre a segurança do sistema eleitoral, ao afirmar que “pouco ou nada podemos fazer no sentido de garantir a lisura do pleito”. Na época, trabalhava como juiz eleitoral e foi afastado das funções.

Entre os procedimentos que devem entrar nas pautas de julgamento de 2023, também há um relacionado com uma publicação feita pela desembargadora Maria do Carmo Cardoso, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), no final do ano passado. A magistrada, que mantém boas relações com a família Bolsonaro, fez uma publicação elogiando manifestações antidemocráticas realizadas na porta de unidades militares.

Do Tribunal de Justiça do Rio, o desembargador Marcelo Lima Buhatem responde a uma sindicância por ter feito diversas postagens que sugeriam “engajamento político-partidário em prol de um candidato ou desabono a outro”, de acordo com o CNJ. Na decisão, ainda é ressaltado que o magistrado fez menção positiva ao então presidente Jair Bolsonaro em nota da Associação Nacional de Desembargadores (Andes), presidida por ele. Em novembro de 2021, uma foto que mostrava Buhatem junto à comitiva de Bolsonaro em uma viagem a Dubai gerou questionamentos. Na ocasião, ele alegou que estava na cidade de férias.

Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Antônio Francisco Montanagna também teve sua página no Facebook bloqueada por postagens que “carregam uma série de imagens e expressões de cunho discriminatório, com vinculação a um dos candidatos à Presidência da República”, durante o pleito eleitoral. Segundo a reclamação disciplinar do CNJ, “sobressaem indícios do propósito de desinformação e propaganda negativa, sugerindo engajamento político-partidário em prol de um candidato ou em desabono a outro”.

Mais de 70 posts

Já a juíza do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) Rosália Guimarães Sarmento responde a duas reclamações disciplinares que também aguardam decisão do CNJ. Os procedimentos apontam que ela teria publicado mais de 70 mensagens, entre tuítes e retuítes, em outubro, declarando voto no presidente Luiz Inácio Lula da Silva e criticando Bolsonaro. Em uma das postagens, chegou a dizer que “Bolsonaro apoia o crime” e pedir que seus seguidores “votassem 13”, número de Lula.

Todos esses processos foram abertos a partir de uma portaria, assinada em setembro do ano passado por Luís Felipe Salomão. No documento, o ministro determinou que “ficam vedadas manifestações que contribuam para o descrédito do sistema eleitoral ou que gerem infundada desconfiança social acerca da Justiça, segurança e transparência das eleições”, além de canais que impulsionem esse tipo de conteúdo.

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região afirmou que “tomou conhecimento das postagens por meio da imprensa” e que a responsabilidade sobre o conteúdo das publicações é dos magistrados. O juiz Mauro Caum Gonçalves, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), informou que não vai se pronunciar sobre o procedimento do qual é alvo. Os outros citados também foram procurados, mas não se manifestaram.